Resistência democrática

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Por: Eduardo Ricci

Todas as pessoas de bem, que defendem a democracia e o Estado de Direito, certamente apoiam as reações institucionais contra os grupos de extrema direita que estão literalmente ‘esticando a corda’ no Brasil. A escalada de manifestações antidemocráticas em defesa da intervenção militar, ameaças e agressões aos profissionais da saúde, da imprensa, a ministros do STF, governadores, prefeitos  e a parlamentares, culminaram no fim de semana com o lamentável ataque pirotécnico contra as instalações do SFT e do Congresso.

A liberdade de expressão é um direito de todos, mas não pode ser usada para justificar ataques a autoridades constituídas ou aos Poderes da República. O mais recente ataque das milícias direitistas à cúpula do Poder Judiciário contou com o aval informal do presidente Bolsonaro, que não se manifestou sobre o ato. O presidente participou de alguns desses atos antidemocráticos, contrariando inclusive as medidas de isolamento na pandemia, mas não é investigado por isso.

A agressão às instalações do STF foi tão grave que a Procuradoria Geral da República, mesmo sob o tímido Aras, foi obrigada a pedir a prisão da ativista bolsonarista-fascista Sara Giromini e mais cinco pessoas na investigação sobre o financiamento dos protestos antidemocráticos e fake news.  Inspirada em Sarah Winter, militante nazifascista na Inglaterra durante a Segunda Guerra Mundial, a senhora Geromini vinha pedindo para ser presa há semanas, como admitiu o próprio irmão dela, que não apoia os atos abusivos da irmã.

Ela e outros integrantes de movimento bolsonarista são suspeitos de crime contra a Lei de Segurança Nacional, ao liderar o grupo 300 do Brasil, de apoio ao presidente. O grupo havia montado acampamento na Esplanada no início de maio, desmontado por ordem do governador do Distrito Federal Ibaneis Rocha no fim de semana. Muitos dos acampados portavam armas, como admitiu Sara, alegando que serviam para a proteção dos membros do grupo. Ao pedir o fim do acampamento, o Ministério Público do DF tratou o grupo como milícia armada, o que é proibido pela Constituição.

Antes de comandar o lançamento de fogos contra o STF, Sara chefiou em 31 de maio uma manifestação com referências a grupos neonazistas e de supremacistas brancos americanos como a Klu Klux Klan. Os manifestantes marcharam, à noite, vestidos de preto, com máscaras e empunhando tochas de fogo, gritando palavras de ordem contra o ministro Alexandre Moraes.

No domingo foi preso também o ex-servidor do governo federal Renan Sena, que também integra o grupo 300, por calúnia e injúria após divulgar vídeo ofensivo contra autoridades dos Três Poderes e contra o governador do DF. Segundo Polícia Civil, a voz de Sena pode ser ouvida também no vídeo em que grupo lança fogos contra prédio do Supremo. Em tom de ameaça, perguntavam se os ministros tinham entendido o recado e mandaram que eles se preparassem.

O governo do DF também adotou outras medidas importantes como a exoneração do subcomandante geral da Polícia Militar, que não tomou providências contra os manifestantes que atacaram o prédio do Supremo.  E multou o ministro da Educação, Abraham Weintraub, em R$ 2 mil por não usar máscara durante um protesto de apoiadores do governo.  O uso é obrigatório em áreas públicas da capital federal. O ainda ministro – deve cair em breve – reafirmou sua opinião sobre os ‘vagabundos’ do STF, para os quais defendeu a prisão durante a reveladora reunião ministerial do dia 22 de abril. Por conta dessa declaração, Weintraub também é investigado no inquérito do STF que apura disseminação de fake news e ofensas a ministros da Corte.

A resposta aos arroubos ditatoriais e a emulações nazi-fascistas precisa continuar merecendo a resposta adequada das instituições democráticas, em especial do Judiciário e do Legislativo, Ministério Público, OAB, ABI, órgãos de imprensa e entidades sérias da sociedade organizada. A reação às movimentações fascistas da base e da cúpula bolsonaristas, por mais aterradoras que sejam, não pode ser a do avestruz. É preciso reagir em defesa da legalidade, com a racionalidade que recomendam as experiências históricas. São muito bem-vindas e necessárias as amplas frentes pró-democracia e antifascismo, bem como a luta nas ruas, nas redes sociais, as manifestações das entidades do mundo jurídico e dos segmentos responsáveis da sociedade.

O Brasil tem dois grandes problemas de saúde pública, o coronavírus e o governo Bolsonaro. A pandemia global mal-enfrentada por um governo ultraneoliberal com pretensões fascistas, está ganhando proporções incontroláveis no país. Sem estatura para comandar a Nação no combate à pandemia, desacreditando a ciência e a OMS e desrespeitando sistematicamente normas de segurança sanitária, o indigno mandatário chegou ao extremo da irresponsabilidade criminosa: estimulou seus apoiadores a invadirem hospitais para checar a existência de leitos vazios. Alguns já começaram a obedecer, depredando instalações hospitalares e agredindo trabalhadores da saúde.

Os invasores devem ser responsabilizados criminalmente, bem como quem os incentiva. Ou teremos o agravamento do caos que começa a tomar conta do país por conta da gestão incompetente da pandemia e das afrontas ao sistema democrático. Chega!

Eduardo Ricci é jornalista em Mato Grosso