O aeroporto é de Cuiabá ou de Várzea Grande?

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Cuiabanos e várzea-grandenses vivem em, quase,
perfeita harmonia. Afinal, as duas cidades são
divididas – e também ligadas – apenas por algumas
pontes. Mas há uma questão que, quando entra em
cena, sempre causa discussão: “O aeroporto é de
Cuiabá, ou de Várzea Grande?”
A edificação em discussão é o Aeroporto
Internacional Marechal Rondon que, já respondendo
a pergunta, é de Cuiabá, mas está localizado em
Várzea Grande.
Mas, para explicar direitinho essa história, e te
deixar com a resposta na ponta da língua quando
surgir essa pergunta na mesa do bar, na reunião de
família, ou até mesmo durante uma discussão nas

A questão dá início à série “LIVRE responde”, que
esclarecerá questões sobre Cuiabá, que pairam na
cabeça dos cuiabanos e paus-rodados.
Distrito de Cuiabá
Para o doutor Paulo Modesto, não é significativo se
o aeroporto é da Capital, ou da cidade vizinha, pois
o Marechal Rondon deve ser visto como de Mato
Grosso.
“O aeroporto é de Mato Grosso, nós temos hoje um
aeroporto internacional, na cidade de Várzea
Grande, que, quando foi feito, Várzea Grande era um
distrito de Cuiabá. Claro que, quando foi inaugurado
já era um município, mas quando foi feita a escolha
da área, todos os projetos, Várzea Grande era do
município de Cuiabá”, explicou o professor.
A construção do aeroporto teve uma longa história.
Os projetos tiveram início em 1942, mas demorou 14
anos para que o local ficasse pronto e a inauguração
do Marechal Rondon aconteceu somente em 1956.
Durante esse período, Várzea Grande deixou de ser
um distrito de Cuiabá e se tornou um município.
“Na verdade era um bairro de Cuiabá, né? Você não
ouve dizer por aí que o Porto é o segundo distrito?
Tinha 3 distritos em Cuiabá: o 2º era o Porto e o 3º
Várzea Grande. Agora, demorou tanto [para ficar
pronto], de 42 para 56, que [a história] seguiu. O
dinheiro que foi usado para as obras era do Governo
Federal, da aeronáutica”, contou Paulo Modesto.
O professor afirmou que toda a demora foi motivada
por falta de recursos durante os anos da
construção.

O primeiro aeroporto

Segundo Modesto, apesar de ser a Capital, Cuiabá
não foi a primeira cidade de Mato Grosso a receber
um pouso de avião, mas sim Cáceres 220 km da
Capital), em 1927. O voo foi realizado por um
hidroavião.
Cuiabá só foi receber seu primeiro voo em 1929,
quando não tinha nem 50 mil habitantes. Uma
aeronave vinda de São Paulo pousou no pequeno
Aeroporto do Campo Velho, que ficava entre as
avenidas Fernando Corrêa e a Carmindo de
Campos, onde hoje é localizado o Bairro Pico do
Amor.
“A pista era pequena, de terra, acho que ela não
tinha nem 600 metros. Se não me engano, esse voo
vinha de São Paulo. Não foi a inauguração, foi só o
1º pouso, a chegada do 1º voo. Esse aeroporto
funcionou por toda década de 30”, relatou.
O Correio Nacional, por exemplo, pousava no
Campo Velho na década de 30. Os voos do local não
eram destinados para transporte de pessoas.
Porém, segundo Modesto, às vezes, quando tinha
lugar sobrando, era possível “pegar carona” em
algum voo.
Cuiabá contou, ainda, com o hidroavião, que
pousava sobre as águas do Rio Cuiabá e
proporcionou os primeiros voos de transporte de
Mato Grosso.

“Porque esse primeiro pouso em Cuiabá [no Campo
Velho] não era transporte civil. No Rio Cuiabá já
pousou a companhia aérea Condor, que foi a
primeira que trouxe para Cuiabá um aparelho
pequeno, de 4 pessoas, era o piloto,
radiotelegrafista, copiloto, e 4 pessoas. E, depois,
passaram para uma aeronave maior, de 11 pessoas,
isso na década de 30″, contou o engenheiro Paulo
Modesto.
No final da década de 30, foi criado um aeródromo
com melhor estrutura, chamado à época de
Aeroporto Campo de Aviação, ou Aero Clube de
Mato Grosso, onde atualmente é o Círculo Militar,
que funcionou por mais de uma década.

A cidade foi crescendo e o desenvolvimento trouxe
a preocupação de que a área onde existia o
aeroporto de Cuiabá à época não tinha a extensão
desejada para um aeroporto de grande porte, como
necessário para a Capital de Mato-Grosso.
Diante disso, em 1942 foi criado o Ministério da
Aeronáutica e dado início ao estudo para a criação
de um novo aeroporto. A princípio, duas áreas foram
apontadas como opções, uma na região do Coxipó,
em Cuiabá, e outra em Várzea Grande, que foi, por
fim, escolhida.
Mas foi somente em 1949 que o terreno onde hoje é
o Aeroporto Marechal Rondon foi doado
oficialmente pelo governo estadual a Cuiabá. Mas,
segundo Modesto, as obras tiveram início antes do
processo oficial de doação da área.
“Tem muita gente que acredita que foi peso político.
Existiam muitos políticos na época, inclusive várzeagrandenses, que tinham o interesse que o aeroporto
fosse para lá, porque eles achavam que ia puxar o
desenvolvimento para aquela região”, disse o doutor
Paulo Modesto.
O professor conta que a necessidade de um novo
aeroporto era tamanha, que a primeira pista de
pouso era de terra, sem pavimentação, e ainda não
havia uma delimitação exata da área que
pertenceria ao aeroporto. Até que foi realizada a
doação dos 700 hectares, como desejava o
Ministério da Aeronáutica, em 1949. E a inauguração
oficial aconteceu em 1956.
“É possível que antes de 1956 tenha acontecido
algum pouso. Na verdade, em 56 a pista já era
pavimentada. Então, foi a inauguração, mas eu não
sei dizer se antes disso teve algum pouso, na pista
que era de terra. Certamente os aviões pequenos
deveriam pousar antes disso”, disse o professor.

Aeroportos em cidades vizinhas

Cuiabá não é a única capital dos estados brasileiros
cujo aeroporto está situado em uma cidade vizinha.
Natal e Curitiba, por exemplo, também seguem o
mesmo padrão. O motivo, segundo Paulo Modesto,
é a limitação que um aeroporto traz para o
crescimento de uma cidade, no sentido de estrutura
urbana, para manter a proteção dos voos.
“Outra questão é você interferir no dia a dia dessa
cidade. Nós fazemos estudos aqui na Universidade
UFMT de poluição sonora, já fizemos alguns do
aeroporto e é impressionante como a
circunvizinhança de Várzea Grande é afetada. Se
você olhar a parte de cima, o aeroporto Marechal
Rondon está envelopado pela cidade, na verdade o
aeroporto dividiu essa cidade em duas partes”,
disse o doutor.
“É claro que na época que ele foi pensado não
existia a outra parte, existiam alguns bairros, mas
não se pensava que ia dividir a cidade em duas.
Então, hoje você vê muita gente com problemas de
incômodo em função do aeroporto. A própria
questão de edificação da área precisa ser
controlada, em função do pouso e decolagem. Tem
que ter uma área de segurança aérea que impede a
construção de edificações”, completou.

Curiosidade

Cuiabano, Paulo Modesto não só estuda a história
da Capital mato-grossense, como viveu parte dela
de perto. Ele conta que morava na Rua XV, no
Centro de Cuiabá, quando João Goulart era
presidente do Brasil, e presenciava Jango passando
na porta de sua casa para fazer compras na
Sapataria Mercúrio, que, na verdade, vendia um
pouco de tudo.
O então presidente costumava trazer sua esposa,
Maria Thereza Fontella Goulart. Em uma dessas
viagens, ao chegar no aeroporto de Cuiabá, a
primeira-dama do Brasil precisou ir ao banheiro e
ficou estarrecida com o que viu.
“Ela pressionou o marido, argumentou, para que
viesse um recurso para Cuiabá, porque fez o
aeroporto mas não tinha a estrutura, um aparato de
recebimento das pessoas, era um galpão de
madeira. Eu imagino que ela foi ao banheiro, e como
devia ser o banheiro, né? E ela mandou recurso”,
contou o engenheiro civil cuiabano, se divertindo
com a lembrança.
Por este motivo, segundo o doutor Paulo, o
aeroporto chegou a ser chamado, por um curto
período, de Maria Thereza Fontella Goulart, o que
não chegou a ser oficializado.
“Ouço dizer que chegou até ter uma placa lá, mas
veio o golpe militar no Brasil. Então, acabaram com
isso, né? Colocaram Marechal Rondon, surgiu
depois”, disse.

O nome
A lei nº 4.629, que determinou que o aeroporto que
servia a Cuiabá e Várzea Grande se chamaria
Marechal Rondon, foi assinada no dia 14 de maio de
1965, no governo do então presidente Humberto de
Alencar Castello Branco.
Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon foi um
engenheiro militar e sertanista brasileiro nascido em
Mimoso, distrito de Santo Antônio do Leverger 35
km de Cuiabá), famoso por suas explorações de
Mato Grosso e da Amazônia, por sua competência
na construção de linhas telegráficas, inclusive fez a
primeira linha telegráfica de Mato Grosso, e por ser
um intenso defensor da população indígena.
“Ele foi um pacificador, se preocupava muito com o
‘não ataque’, com a proteção dos índios. Ele foi
indicado para o prêmio Nobel da Paz. Mas,
infelizmente… Dizem os estudiosos – que não são
brasileiros, tá? , que, com a obra que ele fez, foi
uma das maiores injustiças de não ter dado o
prêmio para ele, pela magnitude do
empreendimento que ele fez para o país. Ele ligou o
Brasil com linhas telegráficas”, afirmou o professor
Paulo Modesto.
Rondônia recebeu esse nome em homenagem a
Marechal Rondon. Ele é o patrono da arma de
Comunicações do Exército Brasileiro. E o “Pai das
Telecomunicações Brasileiras”. Inclusive, o dia 5 de
maio, data de seu aniversário, é também o Dia
Nacional das Telecomunicações.

Fonte: O Livre