Cuiabano faz sucesso no exterior amarrando e fotografando pessoas

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Agressiva, submissa, fetichista e, ao mesmo tempo, poética, sensível, delicada. A arte controversa do fotógrafo cuiabano Fábio DaMotta, de 39 anos, pode dividir opiniões no Brasil, mas tem conquistado cada vez mais espaço mundo a fora. A matéria foi produzida pelo site Midianews.

Após completar uma tour pela Europa, onde fotografou 105 pessoas e passou por sete países, Fábio agora retorna à Paris para um trabalho unindo bondage com corpos dançantes, na Escola Contemporânea de Dança.

Segundo definição da Wikipédia, bondage é um tipo específico de fetiche, geralmente relacionado com sadomasoquismo, onde a principal fonte de prazer consiste em amarrar e imobilizar seu parceiro ou pessoa envolvida.

Ele também relata que recebeu convites para realizar uma performance de bondage, com a técnica de amarração, em uma galeria de arte de São Francisco, nos Estados Unidos.

O artista ainda revela que até o fotógrafo da Madonna, Steven Klein, chegou a usar uma foto de suas sessões de bondage em uma campanha da cantora no Instagram. Após a grande repercussão, Klein entrou em contato com o cuiabano manifestando interesse em trabalhar com ele.

“Ele nem tinha entrado em contato comigo primeiro e usou a minha foto. Aí foi aquele pampeiro porque meu seguidores são super fiéis e começaram a me marcar no perfil da Madonna até que ela me marcou na foto. Aío fotógrafo entrou em contato comigo e falou: ‘Quando vier para Nova Iorque eu quero fazer um trabalho com você’. Vamos esperar os próximos capítulos”, conta DaMotta.

Agora ele se prepara para fazer uma viagem pelas Américas onde vai fotografar pessoas amarradas com cordas utilizando a técnica japonesa shibari.

Arte polêmica

Inicialmente, Fábio tinha um projeto artístico de nus sem mostrar o rosto dos modelos, intitulado DaMotta Faceless.

“Eram sempre corpos nus sem rosto para quebrar. Eu nunca coloquei o rosto para não identificar a pessoa, para não olharem como uma pessoa, mas sim como um objeto mesmo”, explica.

Todo o seu trabalho sempre foi voltado para o Instagram, mas o artista começou a perceber que estavam surgindo muitos perfis parecidos. Então, começou a surgir a necessidade de se diferenciar.

“Com esse lance de todo mundo ter um Instagram, todo mundo fazer Instagram de gente pelada, eu percebi que precisava mudar isso, que precisava mudar alguma coisa. Dar uma diferenciada dos corpos nus. Tinha bastante corpus nus, mas precisava de um ‘plus’”, relata.

Fábio admite que sempre teve interesse em dominação e submissão na sua vida pessoal. Em 2007, ele já havia feito um trabalho com shibari, a arte da amarração japonesa, para uma revista em São Paulo. Mas somente em 2015 que o fotógrafo retomou a técnica.

“Foi em Cuiabá que eu comecei a fazer trabalho de amarração. Em 2015, veio de novo essa imagem na minha cabeça e eu resolvi procurar na internet”, relembra.

Um dia, ele fez um nó em sua perna, fotografou e postou no Instagram. De repente, surgiram centenas de comentários e curtidas o elogiando. Foi aí que ele percebeu para onde iria voltar a sua arte.

Hoje, Fábio transforma a maneira como se olha o corpo humano. Sob o prisma das voltas e mais voltas do bondage, aliadas à delicadeza das flores e das cores, o fotógrafo provoca o público a sair da zona de conforto.

“Eu apropriei da técnica para fazer um trabalho mais soft, um trabalho que tem essa submissão, que tem essa imobilização, mas com esse apelo artístico. Esse lance de entrar as cores dá uma delicadeza. Então, quebra total a imagem forte e agressiva”, afirma o fotógrafo.

Agora, além de vender as fotografias, DaMotta também oferece sessões particulares para quem quer experimentar ser amarrado e clicado pelo profissional.

Preconceito

O artista define o bondage como um tipo de fetiche sexual, que geralmente está ligado ao sadomasoquismo. No bondage, a pessoa pode ser amarrada ou imobilizada com qualquer material, não especificamente uma corda.

Já o shibari, segundo Fábio, é uma técnica milenar japonesa que surgiu como forma de torturar os inimigos por meio da amarração. Séculos depois, foi apropriada por americanos para prazer sexual. Porém, ele ressalta que existem métodos específicos para a prática, além de uma corda especial.

“Como eu uso outro tipo de corda, sem ser a corda original do shibari, eu uso flores, eu uso fita, então eu assino bondage porque qualquer forma de você amarrar é um bondage”, afirma.

Por ser relacionado ao sexo e ter corpos nus, suas fotos ainda são pouco aceitas no Brasil, principalmente em Cuiabá. Para ele, as pessoas não conseguem entender que “não é indecência; é arte”.

“Como eu fiquei esse tempo na Europa, eu senti o quão preconceituoso o brasileiro é com tudo, não só com essa arte. Aqui no Brasil, as pessoas tem essa coisa muito sexualizada, todo mundo já acha que é sexo. Na Europa, não. Eles têm muita visão artística, eles veem muito o potencial da arte, essa coisa da imagem que ao mesmo tempo é forte e é sensível com a quebra das cores, das flores”, diz Fábio.

Atualmente morando em São Paulo, o artista se sente intimidado em apresentar seu projeto na Capital mato-grossense. Até sua própria família conhece pouco do seu trabalho artístico.

“Em Cuiabá, na verdade, eu nem mostro. Em Cuiabá, as pessoas são muito ‘cabeça fechada’. Eles são assim, eles não são educados artisticamente, não tem cultura artística. Eles não estão preparados para esse tipo de imagem”, afirma.

Vida em Cuiabá

Fábio saiu de Cuiabá muito cedo para estudar, aos 18 anos. Apesar disso, ele conta que teve uma infância e adolescência muito prazerosa. Sempre vivia em contato com a natureza, seja na fazenda ou em Chapada dos Guimarães.

Meu pai tinha fazenda, então a gente foi criado no meio do mato. Na época que eu morava aí, a Salgadeira era maravilhosa. A Chapada dos Guimarães era outra coisa”, conta.

Ele afirma que criou um carinho especial por Chapada e hoje, quando volta para Cuiabá, passa mais tempo lá do que na Capital.

Para ele, sua adolescência foi de descobertas. O artista conta que sempre soube que era homossexual, mas preferiu deixar as coisas acontecerem naturalmente. Ele chegou a namorar com meninas, mas também se aventurou com o mesmo sexo.

“Quando eu me mudei de Cuiabá para Londrina, que primeiro eu fui para lá, eu resolvi que não ia ter mais essa vida dupla, que eu ia me assumir gay. Mas foi muito natural porque nunca ninguém me cobrou nada, meus pais nunca cobraram nada”, revela.

Segundo DaMotta, seus pais nunca se importaram com sua sexualidade e esse tema sempre foi normal na sua casa. Ele nunca precisou ter aquela conversa de “sair do armário” e nem foi cobrado.

“Eles sabem, mas nunca tive a necessidade de falar. É isso que eu acho que todo mundo deveria fazer porque ninguém tem nada a ver com a vida sexual da outra pessoa. O que vai mudar? Foi uma coisa muito natural, muito saudável, fui muito bem respeitado”, afirma.

Após morar muitos anos em São Paulo, onde aprendeu a fotografar e começou a trabalhar no mundo da moda, Fábio retornou à Capital mato-grossense e abriu um estúdio de fotografia, em 2013.

“Trabalhando com moda, fiz bastante São Paulo Fashion Week. Eu sempre gostei, tanto é que quando fui montar meu estúdio em Cuiabá, era exclusivamente só para fazer book das bonitas, era bem book de beleza”, relembra.

Ele chegou a fazer algumas exposições fotográficas, mas se sentia limitado e com a sensação de que não conseguiria avançar no seu trabalho morando em Mato Grosso. Outro ponto que o influenciou a morar fora mais uma vez foi a questão da sua sexualidade.

“Tem um lance também da minha vida pessoal, que Cuiabá não combina. Não dá certo ser uma bicha em Cuiabá. Isso é algo que eu sempre sofri, nunca consegui me relacionar com as pessoas”, desabafa.

Apesar disso, foi em Cuiabá que ele desenvolveu seu projeto maior com bondage. Isso abriu as portas para o mundo.

“Um monte de gente queria, me pedia para amarrar no Instagram e comecei a responder essas pessoas falando que eu cobrava. Aí foi que começou a desenvolver essas sessões. Agora, a galera me contrata para fazer esse tipo de trabalho”, diz.

Confira vídeo

Visão no horizonte

Focado em conquistar novos territórios, Fábio já publicou dois livros limitados com o foco em arrecadar fundos para viajar pelo mundo fotografando suas sessões de bondage.

“O primeiro é mega pornográfico, que eu fiz para arrecadar dinheiro para fazer essa tour pela Europa. Eu vendi 600 livros pelo Catarse. Eu faturei uma grana e fui para Europa. Dessa viagem, eu criei outro livro, que eu vendi 280 pelo Catarse, que é para esse projeto da tour América”, revela.

Ele se prepara também para lançar um documentário sobre as suas sessões em outubro. Gravado em Londres com direção do inglês Nish Gera, o filme conta um pouco da sua vida como artista enquanto as cenas mostram como é o trabalho de bondage. Foram três dias de gravação e o filme será lançado em 88 festivais de cinema no mundo.

“Estou muito ansioso, mas estou super feliz. Aconteceram tantas coisas boas esse ano. Estou super ansioso esperando o resultado, mas só pelo teaser já deu para sentir com vai ser. Foi uma super produção e estou animado”, declarou Fábio.

O artista também está estudando ampliar esse projeto para performances. Mas ele conta que já chegou até a amarrar objetos em alguns trabalhos. Porém, não pretende mudar o seu estilo, pois percebe que se encontrou no bondage mais suave.

“Está super legal, acho que o mercado está bacana. Eu ainda não parei para pensar o que vou fazer. Está tão fluido que eu não posso pensar em mudar agora que está pegando fogo”, afirma.

Fonte: Midianews