Chamada de ‘filha de macaco’, cozinheira será indenizada por dona de churrascaria

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Churrascaria de Juína foi condenada a indenizar em R$ 15 mil uma empregada que trabalhou como cozinheira no local por 3 meses. Trabalhadora processou a empresa por danos morais após repetidos episódios de racismo e ofensas. Vítima detalhou que a chefe se referia a ela como “”Só podia ser coisa de preto”, “filha de macaco”, “neguinha”, entre várias outras expressões pejorativas.

Além da indenização, a Picanhas Churrascaria e Choperia Ltda terá que pagar todos os direitos trabalhistas acrescidos de multa.

Processo foi julgado pela Vara do Trabalho de Juína e, além da indenização, a mulher pedia pagamento de verbas rescisórias. Durante o processo, a empresa sequer comparecer para se defender.

juiz Adriano Romero destacou que a revelia e a confissão decorrente da ausência de defesa fizeram supor a veracidade das alegações da trabalhadora. Ele ressaltou que o racismo estrutural na sociedade brasileira, combinado com a cultura de subjugação e desqualificação do gênero feminino, reforçaram a conclusão de que a cozinheira foi alvo de sistemática ofensas com o objetivo de inferiorizá-la e desumanizá-la.

Conforme o magistrado, expressões como as utilizadas pela empregadora são covardes, ante a hipossuficiência da trabalhadora negra, intoleráveis, ante o direito fundamental da igualdade entre os seres humanos, e perpetuam estereótipos de gênero e raça “sob a reserva mental subliminar e incabível de que a cor da pele preta as tornam menos inteligentes, menos importantes e menos gente do que as detentoras da pele branca”.

O juiz salientou que nem o Judiciário, nem o cidadão toleram esse tipo de comportamento que quer segregar as mulheres pretas aos serviços domésticos, aos encargos familiares e à exclusão que estimula estereótipos de gênero e raça e dificulta a inserção da mulher preta em certos nichos de mercado. Ele lembrou que os insultos dirigidos à empregada não são expressões idiomáticas, peculiares à língua, mas instrumento que retira a humanidade da mulher preta “para torná-la invisível e sem voz, mediante a destruição de sua autoestima dentro e fora da empresa” e passa a ideia “de que a trabalhadora preta valeria menos que a trabalhadora branca”.

A sentença assinala ainda a necessidade e reprimir condutas preconceituosas, cuja impunidade já não é aceita pela sociedade, “sobretudo, quando se percebe tristemente que a postura discriminatória e preconceituosa foi levada a efeito por uma mulher branca”, gênero que, apontou o juiz, também é desrespeitado e que, neste caso, “passou de vítima a agressora, fazendo girar para trás o conceito da dignidade da pessoa humana”.

Para o magistrado, a postura discriminatória da empregadora feriu dois objetivos principais da Agenda 2030 da ONU, os quais são acolhidos pelo Judiciário brasileiro: trabalho decente (objetivo 8) e igualdade de gênero (objetivo 5).

Pelo dano moral causado à trabalhadora, a empresa foi condenada a arcar com uma compensação no valor de R$ 15 mil. Ao fixar o montante, o juiz levou em consideração o princípio da razoabilidade e proporcionalidade e o caráter pedagógico da penalidade.

Outras condenações

A trabalhadora, admitida em outubro de 2022 e dispensada em janeiro deste ano, irá receber ainda as verbas rescisórias como aviso prévio, 13º e férias proporcionais, além do FGTS acrescido de 40%. A churrascaria terá de pagar também as multas por atraso na quitação das verbas rescisórias. Todas as verbas deverão ser calculadas sobre R$ 3 mil, quantia reconhecida na sentença, após ficar comprovado que somente metade desse montante era prevista em folha e a outra era paga por fora.

Devido à carga horária extensa da cozinheira, que trabalhava das 8h às 13h e das 16h até meia-noite, o juiz reconheceu a necessidade de pagamento das horas extras durante todo o contrato, além de adicional noturno.

A trabalhadora também teve reconhecido o direito de receber pelo intervalo interjornada por não ter usufruído de pelo menos 11 horas de descanso entre um dia e outro de trabalho. O juiz determinou que a empresa pague a integralidade das horas que a trabalhadora deixou de descansar, considerando que ela finalizava o expediente à meia noite e iniciava a nova jornada às 8h do dia seguinte.

Fonte: Gazeta Digital