Mãe planta maconha no quintal de casa em Cuiabá para produzir remédio do filho autista

Fonte:

É no quintal de uma pequena casa em Cuiabá que a mato-grossense Solany Silva Nogueira cultiva mudas de cannabis, a maconha, para garantir um estoque de segurança da matéria-prima utilizada na produção do óleo à base de canabidiol. O medicamento é essencial para evitar crises de epilepsia em seu filho, um adolescente de 15 anos, diagnosticado com esclerose tuberosa e autismo.

Após o uso recorrente do remédio, a incidência de crises diminuíram significativamente. Solany disse ao HNTque antes do tratamento alternativo, o menor chegou a ter 40 epilepsias por dia. O ganho de qualidade de vida do adolescente encorajou a mãe a enfrentar uma longa batalha nos tribunais para obter a autorização e começar a prática. “Sou uma das primeiras pessoas, se não a primeira em Mato Grosso, a receber aval para cultivar maconha de forma regulamentada”, fala Solany.

Os preços elevados e a burocracia para conseguir acesso ao óleo importante por meio do Sistema Único de Saúde (SUS) a obrigou a encontrar formas para não deixar o filho

escoberto. “A Secretaria de Estado de Saúde nunca concedeu o óleo sem judicialização”, contou a mãe à reportagem. Foi quando conheceu casos de famílias espalhadas pelo país em circunstâncias semelhantes que dominaram o básico de técnicas de plantio e de extração do canabidiol. Solany se inspirou nessas histórias para seguir um caminho marcado pelo pioneirismo, enfrentamento ao preconceito e mais liberdade ao filho do sofrimento clínico.

O óleo é extraído da flor da cannabis que demora entre dois e três meses para desabrochar. “Embora façamos o tratamento da terra com os melhores recursos possíveis, não temos um solo totalmente adequado, e isso deixa o processo ainda mais moroso”, explicou a mãe. Quando a necessidade vence a espera, a solução é acionar a Defensoria Pública ou desembolsar R$ 2,5 mil para garantir 30 ml do remédio, suficientes para 15 dias ou menos, dependendo da intensidade das crises do filho.

ACESSO É LEI EM MT

O deputado estadual Wilson Santos (PSD) conhece Solany e a história da sua família. Inspirado pelas dificuldades das mães, o parlamentar editou o projeto de lei 486/2021 que garante a distribuição de remédios à base do canabidiol em Mato Grosso. O texto foi à sanção duas vezes, porém, o governo vetou.

A garantia do direito aos pacientes exigiu meses de negociação nos bastidores da Assembleia Legislativa (ALMT). “Essa questão do preconceito foi vencida em plenário. Os deputados entenderam o sofrimento dessas famílias e a necessidade que possuem”, observou Wilson que, quando venceu os dois turnos no parlamento, já incluiu junto ao PL uma emenda para assegurar as primeiras licitações do óleo.

A Secretaria de Estado de Saúde (SES) teve seis meses para os trâmites. O prazo venceu e os remédios ainda não chegaram à casa de Solany.

MARCHA DA MACONHA EM CUIABÁ

Neste sábado (15), a Associação de Pacientes, Apoio Medicinal e Pesquisa em Cannabis de Mato Grosso (Aspampas-MT) promove a “Marcha da Cannabis Medicial” em Cuiabá. Pais, mães e pacientes se reúnem a partir das 15h no Monumento Ulysses Guimarães, na avenida do CPA, em frente ao Shopping Pantanal para participar da passeata, cujo objetivo é combater o preconceito e chamar atenção para a importância da pesquisa sobre remédios à base do canabidiol.

A Aspampas presta orientação aos associados sobre o cultivo e extração da maconha terapêutica. “Os objetivos de nossa associação vão além das consultas médicas e fornecimento do óleo, mas proporcionar aos nossos pacientes conhecimento e orientação nos primeiros passos na autonomia da produção de seu óleo medicinal”, descreveu a entidade em seu Instagram.

Humanidade, inclusão, isonomia e transparência pautam a associação, que tem transformado vidas de centenas de mato-grossenses como o filho do Solany, que também é vinculado a Aspampa.

“As discussões são muito positivas e quando compartilhamos nossas dores, acabamos um fortalecendo o outro. Sem dúvidas, meu filho ganhou muito mais qualidade de vida após começar a fazer uso do medicamento. Infelizmente, ainda enfrentamos os olhares tortos de pessoas que não compreendem os motivos da luta”, pontuou a mãe.

“O desenvolvimento de um programa para garantir a distribuição do remédio pelo SUS até iria baratear os gastos que o Estado tem com advogados e todo o processo jurídico”, avaliou Solany.

HNT entrou em contato com a SES e a pasta informou que por meio da Superintendência de Assistência Farmacêutica, o órgão estadual finalizou quatro processos de aquisição de medicamento à base de canabidiol. Atualmente, 46 pacientes fazem uso do composto fornecido pela Farmácia Estadual em Mato Grosso.

fonte HNT