Visitação ilegal da ‘Lagoa Azul’ de Nobres vira caso de Polícia e ameaça gruta; veja

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A beleza estonteante da Gruta da Lagoa Azul, em Nobres, segue atraindo turistas desavisados, ou nem tanto, que são levados até lá por guias clandestinos, mesmo que o local esteja interditado há mais de 20 anos. A matéria foi produzida pela Folha do Estado. Confira:

“Lá não é um balneário. As pessoas estão mais preocupadas em fazer fotos e aparecer no Instagram do que em preservar”

A situação já virou caso de Polícia e ameaça a conservação de um monumento esculpido pela natureza ao longo de milhares de anos. Hoje na Delegacia do Município tramitam três investigações sobre as invasões.

A gruta está interditada pela Portaria do Ibama n° 05 de 30 de maio de 1999. Segundo o documento, a medida foi tomada considerando o “avanço da degradação ambiental na Gruta Lagoa Azul, devido ao uso turístico descontrolado e predatório”, diz trecho.

A interdição previa a colocação de cadeados e placas informativas nas entradas principais até que um Plano de Manejo para a conservação da caverna fosse apresentado pela Prefeitura de Nobres. Isso nunca aconteceu e o que seriam dois anos de interdição se tornaram 24.

Para a presidente do Comtour (Conselho Municipal de Turismo de Nobre), a empresária Carla Rocha, a visitação clandestina representa um risco não só a esse bem imaterial, como às pessoas que fazem o percurso, já que não há estrutura e nem regulamentação para isso.

“A gruta precisa ser preservada. Demorou bilhões de anos para ficar pronta. Então não é assim: ‘abre que eu quero ir lá tomar banho’. Não é um balneário. As pessoas estão mais preocupadas em fazer fotos e aparecer no Instagram do que em preservar”, lamenta.

Diversos famosos e anônimos já fizeram o percurso e compartilharam suas empreitadas nas redes sociais. “Quem invade um lugar que está interditado está cometendo um crime ambiental. Não só quem leva, mas o turista também”, diz.

Imagens feitas na gruta mostram pichações antigas, e outras nem tanto, e gravações esculpidas nas formações rochosas. “Havia lugares com estalactites e estalagmites [formações rochosas] de centenas de anos que, de tanto a pessoa passar e colocar a mão, foram desaparecendo, foram se quebrando”, afirma Carla.

Para se aventurar nas belezas da gruta, o turista hoje precisa se arriscar escalando as rochas enquanto se segura nas raízes de árvores que crescem entre elas.

“Se uma pessoa é picada por uma cobra, quebra uma perna, um pé, como é que ela é resgatada do buraco?”, ela questiona. “Ainda não tem uma escada, uma estrutura adequada”.

Segundo a Promotoria do Município, toda denúncia recebida acerca das invasões clandestinas são encaminhadas para a Polícia.

“Quem invade um lugar que está interditado está cometendo um crime ambiental, não só quem leva, mas o turista também”

“Existe um Procedimento Administrativo para acompanhar a Gruta da Lagoa Azul. Eventuais denúncias criminais recebidas por esta Promotoria são imediatamente encaminhadas para a Delegacia apurar autoria, e em especial se há guia que conduzem os turistas, uma vez que foram todos devidamente notificados sobre a interdição”, diz a assessoria da Promotoria.

Caso de Polícia

Segundo a Polícia Civil, as visitações clandestinas na gruta, que faz parte de uma unidade de conservação ambiental, têm sido recorrentes nos últimos dois anos. Diversos boletins de ocorrência foram registrados – os últimos são de agosto deste ano.

As investigações apontam que na maioria dos casos os turistas são pessoas de fora da cidade, que muitas vezes até desconhecem a proibição.

“As investigações buscam desarticular a atuação dos guias clandestinos, sendo alguns deles identificados e responsabilizados”, diz trecho de nota da Polícia.

Conforme apurou a reportagem, são poucos os guias clandestinos que realizam o percurso, no entanto eles agem de forma organizada.

De acordo com relatos, esses “profissionais” cobrariam entre R$ 350 e R$ 500 por pessoa para fazer trajeto, que teria acesso à gruta por meio de trilhas clandestinas na mata. Enquanto um deles levaria os turistas, outro ficaria de tocaia com um rádio amador para avisar sobre a possível chegada da Polícia.

“A Polícia Civil, em conjunto com a Polícia Militar e órgãos ambientais, realiza operações regularmente, além de instaurar procedimentos para responsabilizar as pessoas que entram no local na unidade de conservação de forma clandestina”, diz outro trecho de nota.

A pena para quem invadir o local pode variar de 1 a 5 anos de prisão por crime ambiental, previsto no Art. 40. da Lei 9605/98. “Causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação e às áreas de que trata o art. 27 do Decreto nº 99.274, de 6 de junho de 1990, independentemente de sua localização”, diz trecho de lei.

Olhar para o futuro

Carla conta que foram dois anos intensos de trabalho, desde que assumiu o Comtour, para que hoje haja o vislumbre de ver a gruta reaberta à visitação. “É um sonho esperado há muitos anos por todo mundo”, afirmou.

“Nobres não é só uma cidade que vive de extrativismo de minerais, a grande riqueza de Nobres não está embaixo da terra, está sobre ela”

A gruta passou dos cuidados da União para os do Estado, e atualmente está sob a responsabilidade da Sema (Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso), por meio do Termo de Cessão de Uso da Área, assinado em abril.

“Com esse termo de cessão concedido, a Sema poderá finalizar o projeto de manejo da Lagoa Azul e fazer investimentos em infraestrutura adequada para receber os turistas com segurança e de maneira sustentável”, afirma Carla.

Segundo ela, nunca houve ao longo desses duas décadas a “vontade política e nem visão de turismo” para explorar as potencialidades de Nobres. “Hoje temos pelo menos 30 atrativos com potencial turístico que estão fechados, que não são explorados”, afirma.

A Gruta da Lagoa Azul de Nobres se assemelha muito com a do Lago Azul, em Bonito (MS). A diferença entre elas é que a de lá é “vendida” como ponto quase que obrigatório para turistas do Mundo inteiro e a de Mato Grosso um paraíso por ora proibido.

Em uma publicação de julho de 2022 o atual secretário adjunto de Turismo Felipe Wellaton traçou o paralelo em arrecadação de impostos nas duas cidades e demostrou o grande abismo que existe.

Enquanto Bonito recebeu 256.901 turistas brasileiros e 16.968 estrangeiros no ano de 2021, Nobres recebeu apenas 11.606 e 82, respectivamente.

Isso quer dizer que para cada turista que pisou em Nobres, 23 visitaram Bonito, resultando em R$ 74.280 em arrecadação de impostos federais aqui R$ 5 milhões na cidade sul-mato-grossense.

Carla afirma que a abertura desse ponto turístico vai tirar Nobres do “turismo de day use” e colocar no mapa do “turismo internacional”, assim como em Bonito.

“Nobres não é só uma cidade que vive de extrativismo de minerais. A grande riqueza de Nobres não está embaixo da terra, está sobre ela”, diz.

“Pesquisadores mergulharam na gruta disseram que estavam numa das fontes de água mais bonitas do Mundo”.

Fonte: Folha do Estado