A ‘comercialização de crianças’ venezuelanas pelos próprios pais, responsáveis ou parentes pelas ruas e semáforos de Cuiabá acontece há anos e continua sem solução. Os imigrantes insistem em usar a ‘imagem’ dos menores junto de uma história de necessidade e comovente para sensibilizar a população e com isso conseguir dinheiro, mesmo que conscientemente, desrespeitando leis e o direito da criança. A reportagem é do Repórter MT.
Apesar de o termo ‘comercialização de crianças’ parecer pesado, foi o que agentes da Rede de Proteção da Infância e Juventude de Cuiabá, formada por servidores da Secretaria Municipal de Assistência Social e Desenvolvimento Humano (Smasdh), Conselho Tutelar e Ministério Público Estadual (MPE), por meio da Promotoria da Infância e Juventude, descobriram desde o início dos trabalhos, lá em 2019.
3 crianças foram retiradas dos pais
Hoje, devido à reincidência de exposição nas ruas, há três famílias venezuelanas que respondem ‘ação de suspensão do poder familiar por violação aos deveres de cuidado e proteção em relação aos filhos’, que podem levar à perda da guarda do menor.
Segundo o MP, os fatos citados acima se tratam de dois casos de negligência e um de abandono por parte dos pais.
Durante as abordagens tiveram flagrantes dos mais ‘inusitados’, para não dizer absurdos, entre eles, pai sozinho com três filhos no semáforo próximo à Avenida do CPA, venezuelanos com crianças emprestadas’ de outros parentes também na região do Centro Político Administrativo. Além de mãe venezuelana hospedada em hotel próximo à rodoviária pago com a renda obtida com a exposição do filho, que estava na rua.
Não é de surpreender quando uma criança se aproxima ‘pedindo’ ajuda e ao longe vemos o ‘adulto’, que não necessariamente é o pai ou a mãe, esperando o menor voltar com dinheiro.
Já não há mais ‘desculpas’ para que ainda sejam encontradas famílias de imigrantes ‘expondo’ os filhos nas ruas, pois, o trabalho da Rede de Proteção da Infância e Juventude de Cuiabá já orientou, transcreveu as leis de nosso país ao idioma deles, encaminhou para órgãos para ajudar a conseguir moradia, emprego e vagas em creches e escolas para essas crianças, tanto para a educação delas, quanto para que os responsáveis pudessem trabalhar.
Venezuelanos usam crianças para sensibilizar cuiabanos
Ainda assim, continuamos com essas cenas pela Capital, crianças expostas correndo riscos de atropelamento, sequestro, abusos, exploração, sob um sol que chega a ultrapassar a os 40 graus de temperatura, sem água, alimentação adequada.
Há de se considerar a negligência com a falta de ‘educação’, crianças fora da escola, creches e ambientes que são para o desenvolvimento psicológico e social, que é um direito.
Desde 2019, a Rede de Proteção trabalha na orientação, encaminhamento, medidas protetivas para as crianças, porém, todo o trabalho, muitas vezes, é ignorado e essas famílias continuam nas ruas. Quando não, param por um período, por medo de serem ‘pegos’ novamente, mas logo voltam. O número de imigrantes reincidentes é alto.
“Infelizmente verificamos que essas pessoas estão violando, e muito, o direito das nossas crianças e adolescentes. Tivemos o zelo de traduzir nossas leis para o idioma deles, para que possam receber as informações e não alegar desconhecimento da legislação do nosso país e da proteção que as nossas crianças recebem aqui”, informou coordenador-geral dos Conselhos Tutelares, Davino Arruda.
Rede de Proteção
Segundo o MP, o trabalho começa pelas abordagens e orientações por parte da Secretaria Municipal de Assistência Social, que entram em contato com essas famílias, fazem o levantamento da situação por meio de entrevista social para verificação de informações como dados pessoais, endereço, telefone para contato e composição familiar.
Ainda o tempo em que estão em Cuiabá, se possuem outros familiares, se recebem auxílios do governo, se passaram pela Casa do Migrante ou outro albergue. Em seguida, recebem advertência para que bebês, crianças e adolescentes não sejam expostos nas ruas com o alerta de todos os riscos que tal ação pode oferecer.
Crianças ficam expostas ao sol e a todo tipo de riscos
São orientados a deixarem o ‘ponto’ na rua imediatamente e procurarem o Conselho Tutelar mais próximo de casa, onde os bebês e as crianças serão encaminhados para berçários, creches e escolas da rede pública, aplicadas as medidas protetivas e o acompanhamento social dessa família no auxílio para conseguir emprego e moradia.
No entanto essas abordagens são, muitas vezes dificultadas, pelos próprios imigrantes, que primeiro, usam da língua para se fazerem de desentendidos. Outras vezes falam ‘rápido demais’ para dificultar o entendimento dos agentes da Rede de Proteção, ou ainda metem informações ou passam de maneira imprecisas.
Outro fator é a ‘cena’ no momento da abordagem, quando a família de imigrante ‘se vale’ do apelo social, chamando atenção da população, que sem saber do trabalho real que está sendo executado ali, envolvido numa zona de sensibilidade, não entende que a intenção é resguardar a criança e que para isso é oferecido todo tipo de poio, toma a dor do imigrante, se envolve na abordagem e toma partido errado.
Descumprimento das medidas protetivas
No caso de descumprimento das medidas protetivas, o caso é encaminhado à Promotoria da Infância e Juventude, que vai analisar o caso específico e decidir se há necessidade do ‘acolhimento institucional’ para resguardar o direito daquela criança e tirá-la da rua. Esse é o caso citado no começo dessa reportagem sobre as três crianças venezuelanas acolhidas.
Em último caso, a ação pode terminar com a perda da guarda da criança, caso a Justiça entenda ser a melhor decisão para resguardar esse menor.
Ainda segundo Davino arruda, é muito difícil não se sensibilizar quando se trata de criança em situação de rua, mas a população precisa ‘olhar com outros olhos’ e entender que dar dinheiro é contribuir para a violação dos direitos desses menores.
“A gente percebe que as crianças estão sendo usadas para sensibilizar a população cuiabana, que é bastante receptiva. Achando que estão ajudando as crianças, as pessoas que dão dinheiro, na realidade, estão colaborando para violar os direitos dessas crianças. Por isso a gente pede para que a sociedade, dê dignidade, mas não dê esmola”, enfatizou.
O artigo 129 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o qual se baseia a Promotoria quanto às providências a serem tomadas nesses casos, expõe que após as orientações, encaminhamento a serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família, caso haja o descumprimento das medidas protetivas, como voltar com a criança para as ruas, não matricular a criança na escola, acompanhar sua frequência e aproveitamento escolar, além das garantias de alimentação, bom trato, entre outros direitos garantidos por lei, a Justiça deve proceder com uma advertência, caso seja novamente reincidente, acolhimento institucional, e avaliação do caso desde à perda da guarda, destituição da tutela até suspensão ou destituição do poder familiar.
Fonte: Repórter MT