Preço do boi despenca, mas carne continua custando o olho da cara

Fonte:

As expectativas de que os preços da carne bovina nas gondolas dos supermercados cairiam depois da suspensão temporária das exportações para a China foram frustradas. A saída de cena de um dos principais clientes do Brasil chegou a reduzir em quase 20% o preço da arroba do boi gordo pago aos pecuaristas e aumentou a oferta para os frigoríficos, que passaram a pagar menos pelo insumo. Só que o preço nas prateleiras dos mercados quase não mudou.

Após bater na casa dos R$ 315, a arroba do boi gordo é comercializada, em média, por R$ 250 em Mato Grosso nesta semana. Por convenção, essa queda aliviaria o preço dos cortes da carne bovina nos supermercados, mas acordos firmados e outras influências de mercado, que vão além do fator China, continuam dificultando o acesso dos brasileiros à carne.

“Não somos os formadores de preço”, diz com voz firme Francisco Manzi, diretor técnico Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat), em entrevista concedida à Rádio Capital. Para que a redução do preço alcance o consumidor brasileiro, é necessário “apertar os supermercados, que são os que definem os preços”, avalia Francisco.

Na perspectiva do diretor técnico, as condições do produtor equiparam-se ao do consumidor, pois nenhuma das partes tem o poder de regular o mercado. Francisco explica que nas negociações com o produtor, “os frigoríficos não perguntam quanto custa produzir e quanto o pecuarista quer, a indústria que define o preço”. Enquanto isso, nas gôndolas o preço final para o consumidor “é o mercado que regula”.

“Quando a arroba estava R$ 315 reais e a carne cara nos supermercados, fomos massacrados ‘porque o produtor estava rachando de ganhar dinheiro’. Agora, o preço pago ao produtor caiu mais de 20% e a carne na gondola quase não diminui. Isso demonstra que não somos os formadores de preços”, reforça.

Quando a arroba superava a casa dos R$ 300, um dos influenciadores de preço era a crescente exportação para a China. A desvalorização do real frente ao dólar criou uma pressão adicional, por tornou o preço do mercado internacional ainda mais atraente para os frigoríficos. Tudo mudou há cerca de dois meses, quando as exportações para a China foram suspensas, de forma voluntaria pelo governo brasileiro, após a confirmação de dois casos atípicos de “vaca louca” em território nacional.

– FIQUE ATUALIZADO: Participe do nosso canal no Telegram e fique sempre informado (clique aqui)

No auge da valorização do boi, os insumos da produção pecuária sustentavam parte da elevação de preços. Os produtores que utilizavam o sistema de criação de confinamento ou semi-confinamento foram mais afetados. O motivo é que “eles também são dependentes também do milho e da soja, que são regulados pelo mercado internacional. Quando o preço da arroba caiu, por causa da suspensão das exportações para a China, não teve influência nos custos, que permaneceram os mesmos”, destaca.

Além do impacto sofrido por esse grupo, o modelo de produção em Mato Grosso é formado, em sua maioria, por pequenas propriedades. Conforme a associação, o estado possui 107,4 mil produtores, sendo que a maioria – mais de 80% – tem até 250 cabeças de gado.

“Esses pequenos vivem da atividade e não têm ‘bala na agulha’ para segurar o animal e esperar atingir um melhor preço”, pondera Francisco. Segundo ele, em alguns casos pode até ter condições de segurar a venda, mas “quando o animal atinge o peso do abate ele vende”, para ter capital de giro.

Informações de mercado, confidenciadas ao diretor técnico da Acrimat, apontam que frigoríficos “travaram” os preços com os supermercados. “Muitos fizeram isso para garantir seu fornecimento, estipularam preço para ser praticado durante meses. Então, se hoje a arroba está mais baixa para o produtor, os mercados pagam mais caro para os frigoríficos, arcando com o compromisso. O que resta para o consumidor é pechinchar”.

Fome e fartura

Enquanto brasileiros dividem os ossos da carne para a única refeição do dia, contêineres refrigerados estocam carne à espera do retorno das exportações para a China. A situação evidencia a necessidade urgente de criar políticas públicas que reduzam as diferenças entre a rentabilidade das empresas e a fome no país, disse Francisco Manzi.

“Tudo está caro. O principal problema é a falta de renda, mais importante do que o preço baixo. A falta de recursos afasta os consumidores das gôndolas e tudo de forma geral”, ressalta.

“Carne tem, o que precisamos é de política pública para ter acesso aos produtos, de forma que remunere o produtor – para continuar investindo – e o consumidor tenha acesso a esse alimento tão nobre. Queremos que o brasileiro coma carne”, concluiu.

Fonte: Estadão de MT