Por: Guilherme Maluf
Em pleno ano de 2020, são de uma atualidade visceral as afirmações da Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente (1972).
“Chegamos a um ponto na História em que devemos moldar nossas ações em todo o mundo, com maior atenção para as consequências ambientais. Através da ignorância ou da indiferença podemos causar danos maciços e irreversíveis ao meio ambiente, do qual nossa vida e bem-estar dependem. Por outro lado, através do maior conhecimento e de ações mais sábias, podemos conquistar uma vida melhor para nós e para a posteridade. Defender e melhorar o meio ambiente para as atuais e futuras gerações se tornou uma meta fundamental para a humanidade”.
Apesar de alguns inegáveis esforços na agenda ambiental brasileira nas últimas décadas, nosso país vem sendo veementemente cobrado por investidores estrangeiros em relação aos resultados da política nacional de proteção ao meio ambiente.
Investimentos estrangeiros na área foram suspensos, até que o Governo Federal comprove resultado no efetivo controle de desmatamentos e queimadas que devastaram em escala alarmante a Amazônia Legal, o cerrado e o pantanal em 2019 e no primeiro semestre de 2020.
Diante da situação adversa, o Supremo Tribunal Federal convocou, nos autos da ADO 60, audiência pública para os dias 21 e 22/9, para que o governo, entidades de proteção ambiental, especialistas e outros interessados contribuam para um “relato oficial objetivo” sobre o quadro ambiental no Brasil. “São graves as consequências econômicas e sociais advindas de políticas ambientais que descumprem compromissos internacionais assumidos pelo Brasil”, destacou o ministro Barroso.
A situação agravou-se em 2019, com o avanço das queimadas e das invasões de terras indígenas e de unidades de conservação. “Os danos causados ao meio ambiente comprometem a biodiversidade, a fauna e a flora, que representam enorme potencial econômico e um diferencial para o país. Minam a credibilidade do país internacionalmente, prejudicando a captação de recursos para combater o desmatamento e reduzir a emissão de gases do efeito estufa”, ressaltou o ministro.
O Sistema Nacional de Tribunais de Contas não está alheio à questão ambiental. Desde 2013 o Tribunal de Contas da União realiza auditorias conjuntas com os tribunais estaduais nas Unidades de Conservação Ambiental.Vários tribunais tem investido em auditorias ambientais e criado comitês interistitucionais de combate às queimadas e desmatamento.
No Tribunal de Contas de MT, expedimos em 9/7/2020 aos gestores estaduais e municipais, um estudo técnico como contribuição para a boa gestão ambiental. O estudo alerta sobre as responsabilidades impostas pela legislação atual à SEMA, no cumprimento da política pública de prevenção e combate de queimadas, oferecendo também segurança jurídica aos servidores da secretaria.
Esse estudo mostrou também que sete cidades mato-grossenses estão entre os 10 municípios brasileiros com mais focos de incêndio entre 1º de janeiro e 1º de julho. Poconé é a 2ª colocada, com 350 focos, seguida por Nova Maringá, Feliz Natal, Paranatinga, Brasnorte, Nova Ubiratã e Gaúcha do Norte.
Nesse período, Mato Grosso apresentou um total de 6.775 focos de queimadas, ultrapassando a média mensal histórica nos meses de janeiro, fevereiro, março e abril. Além disso, em 1º de julho, quando se iniciou o período proibitivo de queimadas no estado, ocorreram focos em quatro áreas indígenas. As queimadas urbanas também já incomodam os moradores de Cuiabá e Várzea Grande. O período de estiagem mal começou e a Defesa Civil já registrou quase mil focos de calor nas duas cidades, dos quais 600 só em Cuiabá.
Sem dúvidas, o atual quadro de queimadas em Mato Grosso exige, sobretudo neste momento de pandemia de uma síndrome respiratória, a Covid-19, uma atitude firme dos gestores para reduzir a poluição do ar e o agravamento da saúde humana já muito ameaçada.
O estudo do TCE recomenda que a SEMA efetive um sistema de gerenciamento capaz de assegurar o permanente controle, preventivo e combativo, sobre queimadas no estado. A repressão aos incêndios ilícitos deve ser realizada com organização, método, eficiência, governança e, principalmente, gestão tempestiva de riscos, dada a limitação de recursos e a multiplicidade de focos de queimadas que se alastram pelo estado, ano a ano.
O TCE MT encaminhou o estudo à Sema, ao governador, aos prefeitos e vereadores das cidades mais afetadas pelas queimadas, à Assembleia Legislativa, MPE e Ministério Público de Contas, e seguirá firme em sua missão de proteger o patrimônio ambiental, a bem das gerações futuras e do desenvolvimento sustentável do estado.
Proteger o meio ambiente não é uma opção, mas um dever constitucional a todos nós imposto (art. 23, VI, da Constituição Federal).
*GUILHERME ANTÔNIO MALUF é presidente do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT)