O número de vigilantes que atuam de forma clandestina em Mato Grosso é maior que o de profissionais autorizados e regulamentados por lei, segundo o Sindicato das Empresas de Segurança, Vigilância e Transporte de valores do estado (Sindesp). A estimativa do sindicato é de que mais de 10 mil seguranças irregulares enquanto são 8.200 autorizados pela Polícia Federal.
No estado, existem 66 empresas de vigilância autorizadas a prestar esse tipo de serviço. No entanto, o presidente do Sindesp, Ângelo Roberto Jacomini, explica que a maioria não faz parte dessa lista e funciona sem aval da PF, que é o órgão responsável por fiscalizar o setor.
“Geralmente são pessoas que não são formados pelas academias de vigilantes, não têm acompanhamento nenhum e, muitas vezes, são policiais civis ou militares, que resolvem fazer esses trabalhos informais no tempo livre e acabam cobrando valores menores, o que convence quem está contratando”, afirma.
O vigilante é preparado e contratado para cuidar do patrimônio. Não é autorizado, nem ensinado a fazer qualquer tipo de intervenção usando a força. Pelo contrário, aprende que a primeira coisa a ser feita em casos que precisam de intervenção é acionar a polícia.
“Ele também não é autorizado, por lei, a fazer qualquer tipo de revista pessoal. Mas um profissional que não passa pela formação não a se preocupa com essas regras de conduta”, explica.
Para o presidente do Sindesp, o despreparo é consequência da falta de regulamentação de empresas e profissionais que atuam na clandestinidade.
Isso porque o serviço de vigilância é regulamentado por lei federal e só pode acontecer com autorização da Polícia Federal. Os profissionais devem passar por cursos de formação e de reciclagem a cada dois anos.
Além disso, a cada seis meses as empresas checam a ficha do funcionário para verificar se não houve nenhuma atitude que desabone a conduta dele.
“Ele não pode ter nenhuma ocorrência, nem uma briga de família. Caso aconteça, ele perde o direito de atuar como segurança e a empresa o demite”, explica Ângelo.
Reginaldo Donnan morreu após ser espancado em shopping de Cuiabá — Foto: TVCA/Reprodução
Em Cuiabá, um caso semelhante ao do supermercado Carrefour, em Porto Alegre, aconteceu em 2009, quando o vendedor ambulante Reginaldo Donnan dos Santos Queiroz, 31 anos, morreu após uma sessão de tortura e espancamento na sala dos seguranças do Shopping Goiabeiras.
Na época, quatro vigilantes foram indiciados. Dois deles foram condenados em 2010 pelo homicídio do vendedor ambulante.
Empresário Adriano Henrique Maryssael de Campos foi morto dentro de banco em Cuiabá. — Foto: Reprodução/ TVCA
Em 2011, o empresário Adriano Henrique Maryssael de Campos, de 71 anos, foi assassinado pelo segurança de uma agência bancária em Cuiabá, enquanto passava pela porta giratória e saía do banco. O ex-vigilante foi condenado a sete anos de prisão.
‘Violência e despreparo’
O presidente do Sindicato dos Vigilantes de Cuiabá, Adelino Alves Roriz Junior, afirma que a violência e o despreparo é um problema que atinge toda a categoria.
“É uma situação que suja o nome da categoria, porque quando acontece qualquer problema, qualquer ocorrência deste tipo, a cobrança recai sobre os vigilantes, recai sobre a categoria, quando, na maioria desses casos, esses profissionais envolvidos nem vigilantes são”, diz.
Adelino fala também que, geralmente, os estabelecimentos optam por contratar esses profissionais irregulares por eles cobrarem um preço mais baixo. No entanto, afirma que as consequências podem ser preocupantes.
“Segurança é um assunto sério, mas nem todas as empresas dão a devida importância. Mercados, bares, casas noturnas e eventos são os locais que mais vemos policiais atuando como vigilantes. E são nesses locais que acabam acontecendo confusões e problemas de conduta. O barato pode sair caro”, ressalta.
O Sindicato dos Vigilantes já encaminhou neste ano, pelo menos, oito ofícios a Polícia Federal pedindo a fiscalização de empresas clandestinas.
“Tiramos fotos dos locais e da atuação desses profissionais, fizemos as denúncias, encaminhamos os ofícios a polícia. No entanto, esbarramos na falta de fiscalização”, explica Adelino.
Segundo o vigilante, a resposta do órgão federal é que há falta de estrutura e contingente para atender a todas as demandas.
Marcelo Ferreira é dono de uma escola de formação de vigilantes em Cuiabá. A instituição forma, em média, 30 profissionais por mês.
Ele explica que até para entrar no curso, o aluno deve atender a alguns pré-requisitos: ser maior de 21 anos, estar com as obrigações eleitorais em dia e não ter sido condenado criminalmente nos últimos cinco anos.
“Caso ele não se encaixe nessas regras, não poderá fazer o curso e, consequentemente, ser vigilante. Além dos pré-requisitos, dentro do curso o aluno vai passar por exames físico e psicológico, para saber se está apto a agir de acordo com a conduta equilibrada que o profissional deve ter”, explica.
No curso, o aluno passa por aulas de defesa pessoal e outros onze módulos. Ele recebe o treinamento para intervir, caso seja extremamente necessário, mas não é orientado a fazer isso. A orientação é que o segurança, ao presenciar qualquer ocorrência, acione o poder público – seja os bombeiros, a polícia ou o Samu, dependendo de cada situação.
Caso o profissional vá atuar em eventos com público maior que 3 mil pessoas, ele ainda terá que fazer uma extensão do curso para poder ser autorizado a trabalhar no local.
De acordo com Marcelo, o que põe em risco o serviço de segurança é justamente os trabalhos contratados sem regulamentação.
“O estabelecimento pega um profissional que não é acompanhado por uma empresa, não é fiscalizado. Dessa forma, falta amparo. Esse profissional não vai se importar muito com a conduta correta que deve adotar”, afirma.
Fonte: G1 MT