No centro de várias polêmicas recentes, como nas operações policiais contra celebridades como Gusttavo Lima, as bets têm se popularizado de maneira desenfreada em todo o Brasil. Em Mato Grosso, a população gasta uma média de R$ 261 milhões por mês com essas apostas.
Os dados são da CDL (Câmara de Dirigentes Lojistas) de Cuiabá e revelam que, desse total movimentado no Estado, R$ 41,4 milhões saem da renda de beneficiários do Bolsa Família. Em Cuiabá, esse valor chega a R$ 6,45 milhões por mês.
Segundo a análise realizada pelo Núcleo de Inteligência de Mercado da CDL, houve um crescimento de 0,92% na inadimplência em relação ao ano passado, incluindo uma alta de 2,7% em dívidas relativas a contas de água e luz.
As bets são apostas feitas na previsão de resultados de eventos futuros, como partidas de futebol. Uma análise realizada pelo Banco Central, em agosto de 2024, mostrou que a movimentação mensal dessas plataformas no País foi de R$ 21,1 bilhões.
Junior Macagnam, presidente da CDL, diz que o mercado de apostas é movido por “emoção e impulso”, componentes essenciais também para as vendas do comércio, mas alertou para os impactos do descontrole e o risco de uma possível “epidemia”.
“Quem aderiu a essa febre acredita que pode utilizar seus conhecimentos sobre esportes para faturar e gerar uma renda extra para complementar o orçamento de uma forma divertida”, disse.
O perigo, segundo Macagnam, está em reaplicar dinheiro nessas operações mesmo após perder a aposta, na tentativa de “recuperar o prejuízo e obter lucro”.
“Aposta não é investimento e, quando se perde o controle, vira uma bola de neve, uma areia movediça que pode comprometer a saúde física, mental e financeira das pessoas, além de prejudicar as relações familiares. Muitos amigos médicos acreditam que isso pode se tornar uma epidemia”, afirma.
Comércio estável
Junior Macagnam explica que, apesar da leve alta na inadimplência, o comércio está em um “patamar de estabilidade”.
“No último levantamento feito pelo nosso Núcleo de Inteligência de Mercado, com base nos dados do SPC Brasil, o número de pessoas com dívidas atrasadas caiu 0,1% em agosto em relação a julho”.
A estabilidade se deve ao fato de que o setor oferece diversas alternativas de renegociação de dívidas, segundo Macagnam, permitindo que as pessoas regularizem suas situações.
“No primeiro momento, é possível que determinados segmentos sintam os efeitos dessa tendência, mas o comércio é resiliente, com força para se reposicionar e manter seu papel importante junto à sociedade”, completou.
Uma saída
Macagnam entende a liberdade como um “bem inegociável”, mas alerta que, no caso das bets, é preciso que essa liberdade venha acompanhada de “parâmetros justos para evitar concorrência desleal”.
“Infelizmente, não é o que tem acontecido. As casas de apostas, por exemplo, só passaram a contribuir com os impostos que todas as pessoas jurídicas precisam arcar a partir do fim de julho”, explicou.
Em relação aos beneficiários do Bolsa Família que, em vez de garantir a comida na mesa e o acesso a outras necessidades básicas, gastam seus recursos com apostas, Macagnam diz que a tolerância é zero. “É necessário frear o uso de recursos de programas assistenciais para apostas esportivas”, afirma.
“O grande problema é que, além de não cumprir o objetivo do programa, que é garantir a segurança alimentar para famílias carentes, o Bolsa Família também cria obstáculos no mercado de trabalho”.
Segundo o presidente, mesmo com um cenário de “pleno emprego” em Mato Grosso, empresas não conseguem contratar mão de obra porque muitos profissionais “preferem trabalhar na informalidade para não perder o benefício”, explica.
Para tentar reverter o cenário atual, Macagnam defende a adoção de campanhas educativas sobre os riscos das apostas online.
“Penso que as empresas de apostas deveriam bancar publicidade de educação financeira e com mensagens orientativas para fixar a ideia de que o trabalho é a melhor forma de gerar riqueza”, disse.
Segundo a análise da CDL, uma das faixas etárias mais afetadas pelo endividamento com apostas são pessoas entre 30 e 39 anos, representando 26,6% do total de inadimplentes no Estado. Pesquisas apontam ainda que jovens têm abandonado a graduação e outros projetos de longo prazo para dedicar parte de sua renda às apostas.
“Esse quadro traz consequências profundas nos campos educacional, profissional, financeiro e social. Parte disso se deve à estrutura arcaica do mercado de trabalho e à alta carga tributária que onera o empregador e desmotiva as pessoas”, afirmou Macagnam.
Para ele, os governantes precisam adotar uma abordagem que flexibilize os modelos de trabalho, desburocratize processos, simplifique e reduza impostos, para otimizar os gastos públicos, focando nas áreas que a população mais precisa.
Fonte: Midianews