O governo Jair Bolsonaro (PL) decidiu exigir uma quarentena de cinco dias de viajantes não vacinados que entrarem no Brasil. Pela nova regra, quem apresentar o certificado de imunização contra a Covid e teste negativo poderá cruzar a fronteira sem passar pelo período de isolamento.
A mudança foi anunciada nesta terça-feira (7) pelos ministros Ciro Nogueira (Casa Civil), Marcelo Queiroga (Saúde) e Bruno Bianco (Advocacia-Geral da União).
Hora antes, em evento no Palácio do Planalto, o presidente comparou o passaporte da vacina a uma coleira. “Essa coleira que querem colocar no povo brasileiro. Cadê a nossa liberdade? Prefiro morrer do que perder a minha liberdade”, disse Bolsonaro.
Mais tarde, Queiroga praticamente repetiu a frase do presidente. “Essa questão da vacinação tem dado certo porque respeitamos as liberdades individuais. O presidente falou há pouco: às vezes é melhor perder a vida do que perder a liberdade”, disse o ministro.
Os viajantes não vacinados devem realizar um teste para a Covid-19 no quinto dia de isolamento. Se o resultado for negativo, podem circular no Brasil.
Ainda não há detalhes sobre como será organizada e fiscalizada a quarentena dos não vacinados. O governo deve publicar uma portaria nesta terça-feira (7) ou quarta-feira (8).
O governo também decidiu reabrir as fronteiras terrestres a quem estiver vacinado. Não ficou claro se as regras serão iguais para quem entra por terra ou voos. Os ministros não quiseram responder as perguntas da imprensa.
A Anvisa sugeriu, em 12 de novembro, a cobrança da vacinação ou a imposição de quarentena de quem entra no Brasil. A pressão pelo controle mais rígido das fronteiras aumentou com a descoberta da variante ômicron. Na prática, o governo aceitou o cerne da proposta da Anvisa.
Para contornar o discurso de Bolsonaro, os ministros evitaram o termo “passaporte da vacina” e destacaram que pessoas não imunizadas têm a opção de fazer quarentena no Brasil.
“Nesse contexto que estamos espreitados pela variante ômicron, que não sabemos ainda o total potencial, (vamos) requerer que indivíduos não vacinados cumpram quarentena de cinco dias. E após essa quarentena realizariam teste, sendo negativo, poderiam normalmente, no caso de estrangeiros, aproveitar todas as belezas desse nosso grande Brasil”, disse Queiroga.
Bolsonaro estava travando a decisão de cobrar o certificado de vacinação. Para não desagradar o presidente e apoiadores do governo, auxiliares do mandatário avaliavam esperar uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre o controle das fronteiras.
Mas a pressão sobre o governo cresceu e ministros passaram a considerar inevitável endurecer o controle das fronteiras. Isso porque, além da Anvisa, TCU (Tribunal de Contas da União), DPU (Defensoria Pública da União) e Fiocruz pediram a cobrança do certificado de imunização de viajantes.
Na segunda-feira (6), o ministro Luís Barroso, do STF, deu 48 horas para o Planalto se manifestar sobre o pedido da Anvisa. Com todas as cobranças somadas, técnicos do governo passaram a temer ações administrativas ou na Justiça por omissão.
As portarias sobre o controle de fronteiras são assinadas pelos ministros da Casa Civil, Saúde, Infraestrutura e Justiça. A agência apenas faz sugestões, mas não tem poder decisório.
No anúncio à imprensa, Queiroga fez menção indireta e crítica ao chamado “passaporte da vacina”. “Esse enfrentamento da pandemia não diz respeito apenas a um chamado passaporte, que mais discórdia do que consenso cria. É necessário defender as liberdades, respeitar os direitos dos brasileiros acessarem livremente as políticas públicas de saúde”, disse.
A decisão de passar a cobrar nas fronteiras o certificado de vacinação, além da quarentena aos não imunizados, foi tomada na tarde desta terça.
Para convencer o presidente, os ministros alinharam um discurso para amaciar a nova regra e passar a impressão de que foi rejeitado o “passaporte da vacina”, ainda que o governo vá cobrar regras mais rígidas de quem não tomou o imunizante.
A Anvisa não participou da reunião, segundo integrantes do governo. Além de reduzir infecções, casos graves e transmissão, a ideia da agência é impedir que o Brasil vire foco do turismo antivacina.
Em evento durante a manhã, o presidente distorceu e criticou as recomendações da Anvisa e disse que a agência “quer fechar o espaço aéreo”. “De novo, porra? De novo vai começar esse negócio?”, questionou o presidente, exaltado, diante de uma plateia de empresários em cerimônia da CNI (Confederação Nacional da Indústria).
Bolsonaro também voltou a dizer que quem toma a vacina pode contrair, transmitir e “morrer também” por causa do coronavírus. A imunização reduz as chances de que a pessoa desenvolva casos graves da doença. Bolsonaro diz que não se vacinou até hoje.
Mais tarde, em cerimônia de assinatura de contratos do leilão do 5G, o presidente também apostou na defesa de tratamentos precoces. Além de citar a cloroquina e a ivermectina, disse que “ninguém tinha morrido” em duas aldeias indígenas que visitou, pois os moradores tomavam plantas e ervas medicinais.
“Vemos briga sobre passaporte vacinal. Quem é favorável, não se esqueça: amanhã alguém pode impor algo que você não seja favorável”, disse Bolsonaro. Ele também voltou a levantar dúvidas sobre a segurança na vacinação das crianças.
O STF recebeu, no dia 26 de novembro, uma ação do partido Rede Sustentabilidade com pedido para adotar o chamado passaporte da vacina sugerido pela Anvisa.
“A inércia trata-se, em verdade, de mais uma postura adotada pelo negacionismo e pela postura antivacina do governo do presidente Jair Messias Bolsonaro”, afirmou o partido no pedido.
Representantes do Ministério da Saúde tentavam convencer os interlocutores de Bolsonaro de que é vantajoso pedir o comprovante de vacinação. Um dos argumentos apresentado em reuniões interministeriais é que as restrições de entrada no Brasil por terra ficariam menos duras ao liberar quem está imunizado.
Hoje essas fronteiras estão praticamente fechadas, ou seja, um cenário ainda mais restritivo do que o proposto pela Anvisa. Essa ala do governo também afirmava que o Brasil poderia sofrer restrições de outros países caso mantivesse as fronteiras e aeroportos desprotegidos.
O ministro Tarcísio de Freitas (Infraestrutura) foi alvo de críticas de militantes bolsonaristas por defender o passaporte vacinal, um episódio que aumentou o receio de auxiliares do presidente.
Já o ministro Anderson Torres (Justiça) disse, no fim de novembro, ser contra a restrição e repetiu o discurso de Bolsonaro. “Não precisa. Ela [a vacina] não impede a transmissão da doença”, afirmou.
Fonte: Agência Brasil/Diário de Cuiabá