Fotógrafos citam horror, morte e cenário apocalíptico no Pantanal

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Com a devastação do Pantanal pelas queimadas de grandes proporções, diversos jornalistas e fotógrafos se dirigiram aos principais locais atingidos pelo fogo. Nesta semana, o MidiaNews ouviu relatos de três fotógrafos que estiveram de frente com as chamas.

Os incêndios na região começaram em julho e já consumiram mais de 1 milhão de hectares do bioma no Estado, conforme dados do Ibama.

Mário Friedlander, que já refez trechos das expedições lideradas pelo marechal Cândido Mariano da Silva Rondon no interior do Brasil, revelou que nunca viu imagens tão perturbadoras quanto as do incêndio no Pantanal.

“Estivemos por duas vezes no Parque Estadual do Encontro das Águas, que estava queimando de modo absurdo, e testemunhamos isso com horror e incredulidade”, descreve.

“Vimos muito mais do que fotografamos. Vimos coisas perturbadoras demais, ficamos arrasados e quase deprimidos”, completa.

Lucas Ninno já cobriu a tragédia de Brumadinho (MG), onde centenas de pessoas morreram com o rompimento de uma barragem de dejetos de mineração, e conta que sua passagem pelo bioma em chamas também foi marcada pela morte, tanto de animais quanto de vegetação.

“É incrível a intensidade do fogo. Às vezes você encontra só uns ossinhos e se você toca, eles se desafazem. Foi bem impactante”, relata o fotógrafo.

Enquanto isso, Marcus Mesquita apresenta um cenário de filme de fim do mundo que, agora, é marcante no Pantanal. Ele apresenta uma visão assustadora do local em que esteve.

“Já fui para o Pantanal diversas vezes, voltei ali e o clima é apocalíptico. Você vê a fumaça, uma certa vermelhidão no ambiente. Não é aquele verde e azul do Pantanal. Agora está completamente seco e preto de mata queimada. É um outro lugar, não é mais o Pantanal”, afirma.

Na linha de fogo

Os profissionais acompanharam de perto linhas de fogo junto com as equipes de bombeiros, brigadistas e pesquisadores que combatem as chamas diariamente.

Mesquita, que passou três dias na região de uma fazenda, ficou impressionado com a velocidade do fogo.

Ele conta que estava junto com o Corpo de Bombeiros há cerca de 10 metros das chamas. Ali, perto, o fotojornalista não conseguiu perceber a rapidez.

“Quando a gente olha o fogo a gente tem a impressão de que está forte, mas está lento”, diz.

Quando o grupo estava indo embora, após caminhar cerca de 100 metros, foi necessário retornar ao local, pois o coronel dos bombeiros que coordenava a ação deixou cair o celular. Foi quando Mesquita se surpreendeu com o avanço do incêndio.

“Decidimos voltar para procurar. Quando voltamos, o fogo já tinha queimado toda aquela área de 10 a 15 metros que estávamos. Foi naquele momento que eu percebi o quanto o fogo era rápido”, revela.

Já Friedlander passou 12 dias no Pantanal e acompanhou os incêndios em diversos pontos do bioma. Ele conta que estar perto do fogo é insustentável.

O fotógrafo disse que o calor do fogo é tão intenso que chega a machucar as mãos, mesmo com luvas. Ele ainda quase se intoxicou com a fumaça de tão perto que estava.

“O problema é que o fogo machuca mesmo, até de meio longe já machuca, mesmo com proteção machuca. As câmeras ficam muito quentes, quase sem condições de segurá-las”, descreve Friedlander.

“As costas das mãos sofrem demais e se você usa luva de proteção não consegue manipular os comandos das câmeras”, completa.

Ninno ficou cinco dias acompanhando os incêndios e relata que via animais fugindo conforme as chamas iam avançando. Ele também conta que muitos não conseguiram se salvar.

“Teve um momento que eu fiquei acompanhando uma linha de fogo. Ela via queimando tudo devagar e via os pássaros indo embora conforme o fogo avançava. Ali dentro, que a gente não enxerga, tem muito bicho, tem invertebrado, tem rã, muita coisa. É bem impressionante porque é muito rápido”.

Morte e devastação

Para Mesquita, as visões dos animais queimados e mortos pelo fogo foram chocantes e vão ficar na memória.

“Eu vi a morte. Sei que é muito traumático dizer dessa maneira, mas foi muito disso que eu vi”, conta.

Um episódio o marcou profundamente. O fotógrafo avistou uma capivara sozinha escondida no meio de um matagal. De repente, o animal correu para uma área aberta em direção a um pequeno lago, porém foi surpreendida ao chegar na água.

“Ela correu para se refrescar, tomar água, mas quando chegou lá, ela viu que o lago só tinha lama. Ela não se satisfez. O que traumatizou mais nessa imagem é que ela olhou para um jacaré que estava sendo comido por um urubu. Ela olhou extremamente assustada”, relembra.

Ninno também ficou impressionado com o impacto dos incêndios para a fauna. Ele relata uma foto que fez onde aparece um jacaré morto e, em cima, um bem-te-vi magro.

“Outra foi uma foto que fiz de um macaco bebendo água em uma poça de lama minúscula. Não tinha mais água, eles estão morrendo de sede”.

O fotojornalista revelou que ficou abismado com a seca severa que passa a região. Ele, que cresceu visitando o Pantanal e tem como memória um local verde e cheio de água, viu um ambiente totalmente marrom e preto.

“Nunca vi o Pantanal tão seco como está agora. A água abaixa, mas sempre os restinhos que ficam e concentram animais ao redor. Mas dessa vez eles estavam praticamente secos, não tinha água. Dava para ver animais andando desidratados”.

Friedlander revela que se deparou com uma onça pintada com as patas queimadas. Ele e a equipe que acompanhava tentou resgatá-la, mas foi em vão.

Ele ainda disse que sentiu a tensão muito viva ao atravessar a Rodovia Transpantaneira com ela queimando.

“Difícil dizer o que mais chamou a atenção, talvez a estrada-parque Transpantaneira queimando dos dois lados ao mesmo tempo e nós tendo que atravessar com medo e um nó na garganta”, afirma o fotógrafo.

“Não podia ficar parado”

Friedlander revela que sempre visitou o Pantanal com amigos e auxiliando outros fotórgrafos para produzirem material no local. Por conta disso, ele tem uma ligação especial com o bioma e diz que o ama profundamente.

Com a região pegando fogo, ele não conseguiu ficar em casa apenas assistindo de longe sem fazer nada.

“Como ficar longe do Pantanal quando ele está sendo atacado ferozmente? Partimos em sua defesa com as poucas armas que temos, nosso olhar e nossos equipamentos fotográficos”.

Com isso, ele também lançou o trabalho de documentação das queimadas intitulado “Pantanal em Agonia”.

Mesquita também foi motivado a registrar o que está acontecendo no Estado. A convite da Revista Piauí, ele passou três dias fotografando os incêndios e as consequências.

Segundo ele, resta um sentimento de tristeza em indignação com o que vivênciou de perto durante o trabalho.

“Sou muito próximo da natureza. E indignação com o poder público, principalmente de saber que nosso presidente esteve no Estado e nem teve a mínima preocupação de pelo menos passar no Pantanal. Muito pelo contrário, ele falou que o meio ambiente estava tudo bem”, critica.

Fonte: Midianews