Cinco meses se passaram desde a morte do cuiabano Wilham Attila Aparecido Sene Bertasso, de 31 anos, em uma pousada no Distrito Vale dos Sonhos, em Barra do Garças, e as circunstâncias ainda são um completo mistério.
A família procurou o MidiaNews e fez um apelo às autoridades: “A vida do Wilham a gente não vai ter novamente, mas quem fez isso tem que pagar”, diz o advogado Túlio Sousa de Sene, de 29 anos, primo da vítima.
“A investigação está andando a passos de tartaruga. Nosso apelo é que a Polícia se debruce de fato nesse caso, porque aconteceu com o Wilham hoje, mas amanhã pode acontecer com qualquer pessoa”.
“Causa até um sentimento de revolta. Como assim? Ele foi encontrado morto dentro dessa pousada e ninguém sabe dizer nada?”, questiona.
A Polícia Civil instaurou um Auto de Investigação Preliminar (AIP) e trata o caso como “morte a esclarecer”. O delegado Adriano Marcos Alencar é quem está à frente do caso.
O MidiaNews teve acesso ao documento e nele não é apontado nenhum suspeito.
“A 1ª Delegacia de Barra do Garças instaurou um procedimento preliminar para a apuração da morte e está finalizando a análise das diligências realizadas”, diz nota da Polícia Civil encaminhada à reportagem.
Wilham estava hospedado na Pousada 3K, de propriedade de Nisan Pinheiro Camara. “O proprietário da pousada é um policial da reserva, muito conhecido na cidade”, diz o advogado.
Foi Nisan quem teria encontrado Wilham caído nos fundos do quintal da propriedade e, segundo a investigação preliminar instaurada pela Polícia, ele informou que a vítima estava “aparentando estar em estado de mal epiléptico convulsivo”.
Conforme o depoimento de Nisan, ele saiu para comprar pães e quando voltou percebeu que seus cachorros latiam no fundo do quintal, onde disse ter encontrado o hóspede caído.
“Quando viu o rapaz no chão, viu que ele estava enrolando a língua e até tentou ajudar a desenrolar, e o rapaz conseguiu dar uma respirada funda”, diz trecho do documento.
Segundo o AIP, conforme informações de Nisan, “a vítima se debatia contra o solo, gerando arranhões nos braços pelos espasmos involuntários, que precisou fazer uso de uma colher para sanar a mordedura na língua e para a vítima conseguir respirar”.
Nisan chamou um vizinho e também uma ambulância para socorrer o rapaz a uma Unidade de Pronto Atendimento em Barra do Garças. Os três foram ouvidos pela Polícia Civil. Wilham deu entrada na unidade semi-intensiva do hospital em estado grave, no dia 25 de junho.
“[Estado] Comatoso, respiração agônica, pupilas midriáticas não reativas, bradicárdico, mucosas hipocoradas, cianose de extremidades, presença de grande quantidade de sangue em cavidade oral, presença de hematoma subgaleal occipital bilateral, presença de escoriações em membros superiores em parte posterior bilateralmente e presença de escoriação leve em região dorsal”, diz trecho do prontuário médico.
Conforme o trecho acima, portanto, Wilham estava inconsciente, em estado de coma, com dificuldade para respirar, suas pupilas muito dilatadas e não respondiam à luz, o que indicava uma lesão grave no cérebro, além de muito sangue na boca.
No dia 26, o rapaz foi transferido para uma UTI, onde ficou internado até morrer, no dia 1º de julho, após sofrer uma parada cardiorrespiratória. Ele já tinha sinais clínicos de morte encefálica antes de ter a parada.
Causa da morte
A versão apresentada pelo dono da pousada não convenceu a família, tanto pela falta de detalhes quanto pelas lesões que havia no corpo de Wilham. O laudo pericial determinou como causa um traumatismo cranioencefálico, mas, segundo o advogado, não conseguiu estabelecer a dinâmica do que aconteceu.
Wilham tinha lesões externas no dorso das mãos e nos dedos, na parte interna dos cotovelos, braços e antebraços, e no tornozelo do pé esquerdo, escoriações na têmpora esquerda, na pálpebra e no nariz, além de hematomas ao redor dos olhos.
Já entre as lesões internas, ele tinha hematomas no couro cabeludo e no topo da cabeça, um pequeno acúmulo de sangue no músculo do peito do lado esquerdo, indicando um trauma leve, pulmões com lobos inferiores hepatizados e baço alterado.
“Os traumas em cabeça sugerem mais de um impacto, pois estão localizados em topo frontal e parieto occipital, além do hematoma frontoparietal esquerdo. […] Aparentemente houve mais de uma queda com trauma em diferentes locais na cabeça. Segundo informações, o sangue em boca é decorrente da abertura da boca do periciando com uma colher para que respirasse melhor”, diz trecho do laudo.
Prestes a voltar
Wilham morava em Porto Alegre (RS) e foi casado por sete anos. Abalado com o fim do relacionamento, ele decidiu voltar para Cuiabá e saiu da cidade em 21 de maio. O rapaz passou por Curitiba (PR), Goiânia (GO) e chegou a Barra do Garças no dia 30 desse mesmo mês.
O documento da Polícia chega a mencionar uma suposta depressão, mas Túlio afirma que nunca houve um diagnóstico. “A depressão não chegou a ser atestada por um profissional, mas ele estava em um estado de angústia, foi um relacionamento conturbado. Antes dele vir decidiu ficar um tempo em Barra do Garças, para espairecer em meio à natureza”.
Formado em língua inglesa e atuando como autônomo, Wilham foi descrito como uma pessoa dócil, carinhosa e muito carismática.
“Uma pessoa muito dócil, querida por toda a família. Carinhoso e muito responsável, uma pessoa carismática, cuidadosa, cuidava muito da saúde dele, nunca teve envolvimento com nenhum ilícito, nunca usou drogas, não consumia bebida alcoólica”, disse.
A última informação que a família teve antes da internação do rapaz foi que ele estava hospedado em uma pousada em Barra do Garças. “Recebemos uma ligação do Hospital dizendo que ele tinha dado entrada em estado já de morte, gravíssimo”.
“O proprietário da pousada foi muito omisso, não entrou em contato com a família e quando entrava era por meio de terceiros, de familiares dele. Não deu qualquer assistência. Um cliente dele, um hóspede, foi encontrado daquela forma e ele não prestou maiores esclarecimentos. Só disse que encontrou ele naquele estado e chamou os bombeiros”.
Dúvidas
Segundo Túlio, a família não acredita que Wilham tenha tido uma convulsão, tanto pelo seu histórico saudável quanto pelo tipo de lesões que apresentava, especialmente na cabeça.
“Wilham nunca teve qualquer problema de saúde, nunca teve convulsão. Era tão saudável que ainda ficou duas semanas com o coração batendo. Ele estava morto, o cérebro dele já estava em estado de morte quando deu entrada”, diz.
“Essa versão de que ele supostamente teria um estado de convulsão, isso é uma conversa que não frutifica. O tipo de lesão que o William sofreu foi na parte superior do crânio. É quase que impossível uma pessoa se debater e conseguir acertar essa parte da cabeça. Essa história não convence a família”, completa.
Túlio afirma que um dos principais pontos que causou estranhamento foi a falta de informações sobre o caso e, agora, a dificuldade de se contatar com as autoridades policiais que investigam a morte.
“Ele ter sido encontrado no interior desta pousada e o proprietário não saber explicar como se deram os fatos, quem estava hospedado naquele dia, no dia anterior, e não ter dado esclarecimento para a família. A única pessoa capaz de elucidar os fatos se omitiu, se escondeu”, diz.
Apesar de a pousada ter placas indicando monitoramento, a Polícia Civil disse não ter encontrado câmeras no local e nem nas proximidades.
“A Polícia não dá satisfação para a família. Várias vezes nós tentamos entrar em contato e nunca encontramos os responsáveis pela investigação. Não estou acusando a Polícia de tentar abafar o caso, mas o descaso com que está tratando a família nos causa muita estranheza e desconfiança. Tratam os fatos com desdém, como pouca coisa, sendo que foi um homicídio”, disse.
Túlio disse ainda que sequer o celular da vítima chegou a ser periciado.
Fonte: Midianews