Um artigo da NASA com o título “Quente demais para lidar: como as mudanças climáticas podem tornar alguns lugares quentes demais para se viver” levou muita gente a divulgar nas redes a afirmação de que um estudo da NASA teria apontado o Brasil como inabitável dentro de 50 anos, devido às altas temperaturas planetárias.
No corpo do artigo, redigido pela Equipe Editorial Científica da NASA, os autores alertam para aumentos nas incidências de calor e umidade extremos provocados pelo aquecimento global. Por isso, continua o texto, “cientistas do clima estão rastreando uma medida-chave de estresse por calor que pode nos alertar sobre condições prejudiciais”.
Nesse ponto, o artigo cita um estudo chamado “O surgimento de calor e umidade muito severos para a tolerância humana”, que apresenta o conceito de bulbo úmido (TW), uma unidade padrão para aferir o “estresse térmico”. No entanto, nem nesse artigo, que é de 8 de maio de 2020, e nem no da NASA, há qualquer citação de que o nosso país ficaria inabitável em 50 anos. A pesquisa nem cita o nome do Brasil.
O que é o bulbo úmido citado no estudo da NASA?
No artigo do TecMundo que tratou do assunto, publicado no dia 22, repetimos a informação sobre a temperatura do bulbo úmido citada do site da NASA: “ela mede o quão bem nossos corpos esfriam por meio do suor quando está quente e úmido, e nos diz se as condições podem ser prejudiciais à nossa saúde, ou até mesmo mortais”.
Primeiro autor do estudo de 2020 sobre calor e umidade extremos, Colin Raymond, da Universidade de Colúmbia, nos EUA, afirma que temperatura máxima de TW suportável por seres humanos, quando expostos aos elementos por pelo menos seis horas, é de cerca de 35 °C.
Como TW é uma medida que combina temperatura do ar com umidade relativa, refletindo a capacidade de resfriamento corporal através da evaporação do suor, aumentos das temperaturas globais, como o recorde de 17,09 °C verificado no dia 21 de julho de 2024, elevam igualmente a temperatura do bulbo úmido.
E como nosso país entrou na lista dos “inabitáveis”?
Na pesquisa liderada por Raymond em 2020, o foco é o perigo representado pelo calor úmido que se mostrou mais intenso do que se pensava anteriormente. Nesse sentido, o Brasil não é diretamente citado. As conclusões dizem apenas que, mantido o cenário atual de emissões, “o TW poderia regularmente exceder 35 °C em partes do Sul da Ásia e do Oriente Médio até o terceiro trimestre do século XXI”.
Já no finalzinho do artigo de 2022, da NASA, o autor do estudo, Raymond, que trabalha no Laboratório de Propulsão a Jato da agência espacial norte-americana, cita os países que deverão ultrapassar os 35 °C, “o sul da Ásia, o Golfo Pérsico e o Mar Vermelho por volta de 2050; e o leste da China, partes do sudeste da Ásia e o Brasil até 2070”.
Essa é a única citação do nosso país na matéria da NASA. Para o pesquisador Pedro Camarinha, do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden), não há base científica para apoiar essa tese de inabitabilidade. Em entrevista ao G1, o PhD em mudanças climáticas lembra que uma eventual projeção da Terra em 30 anos dependeria de mais variáveis, além da temperatura do bulbo.
Mas, se por um lado o estudo de Raymond não afirma que o Brasil vai ficar inabitável, ele aponta para um cenário catastrófico para mundo que, logicamente, se aplica também ao nosso país. Falando ao G1, o “guardião planetário” Carlos Nobre alerta que, se não agirmos de forma urgente, “não vamos conseguir aplicar as soluções que impeçam, por exemplo, o país de ferver até 2070”, conclui.
Fonte: Tec Mundo