A matemática que explica por que você quase sempre vai perder com bets

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“Eu conheço uma pessoa que vive só de bets”, “eu vejo muito futebol e quase sempre acerto o vencedor”, “é só estudar bastante, que você vai conseguir ganhar”. Essas são frases comuns ditas hoje em dia em conversas de bar, redes sociais ou até mesmo em canais de internet dedicados a apostas esportivas.

Mas a realidade do mundo das apostas é muito diferente, segundo matemáticos e especialistas que estudam o fenômeno.

A BBC News Brasil conversou com especialistas que dedicaram mais de 20 anos a pesquisar o assunto.

A conclusão deles é que: sim, teoricamente é possível ganhar dinheiro com apostas esportivas no longo prazo. No entanto, a tarefa é tão difícil que só estaria ao alcance de pouquíssimas pessoas.

A grande maioria inevitavelmente vai perder dinheiro se continuar apostando. É só uma questão de tempo.

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“Se você não tem fortes habilidades matemáticas e nunca parou para construir modelos matemáticos para vencer as casas de apostas, você não vai conseguir. Você não vai ganhar dinheiro a longo prazo a menos que trabalhe duro. E trabalhar não significa assistir a muitas partidas de futebol ou ter conhecimento do jogo. Trabalhar duro significa realmente entender as probabilidades”, disse o matemático David Sumpter à BBC News Brasil.

Sumpter é professor de matemática na universidade de Uppsala, na Suécia, fundador de uma empresa que trabalha com matemática e futebol e autor do livro Soccermatics: Mathematical Adventures in the Beautiful Game (“Soccermatics: Aventuras matemáticas no jogo bonito”, em tradução livre).

Ele diz que a habilidade matemática necessária para derrotar as casas de apostas é tamanha, que um apostador que eventualmente consiga isso lucraria mais vendendo seu conhecimento matemático no mercado — inclusive para as próprias casas de apostas — ou fundando sua própria empresa de estatísticas.

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Outro especialista, o autor Joseph Buchdahl, diz que a maioria dos apostadores são como “macacos jogando dardos” — ou seja, contam apenas com pura sorte em suas apostas.

Recentemente ele publicou uma análise em que concluiu que há apostadores com técnicas tão avançadas que são capazes de vencer o mercado no longo prazo. No entanto, eles ainda são casos raros.

“As apostas continuam sendo uma competição extremamente difícil de vencer, onde a margem que uma casa de apostas impõe — além do acesso a alguns dos melhores analistas do setor — significa que apenas uma pequena minoria terá sucesso a longo prazo”, escreveu.

No Brasil, a explosão das “bets” levou o governo federal a anunciar um pacote de medidas para regularizar o mercado.

As casas de apostas precisarão pagar uma taxa para poderem operar, e o governo ainda promete tentar bloquear o uso de cartões de crédito para apostas.

Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também haverá um esforço para restringir a publicidade do setor, como já ocorre com bebidas alcoólicas e cigarros.

Mas será que é mesmo tão difícil assim? Por quê?

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Como funcionam as apostas

Para ganhar das casas de aposta, primeiro é preciso entender o que são as “odds”, que traduzido para o português significa “chances”.

As odds expressam quanto cada apostador ganhará caso sua aposta seja vencedora. Há algumas formas de se expressar uma odd. Os formatos mais comuns são as decimais e as fracionárias.

Uma odd fracionária de 7/4 indica que para cada 4 reais apostados, o apostador terá um retorno de 7 reais (além dos 4 reais apostados) em caso de acerto. Ou seja, o retorno total será de 11 reais.

A mesma odd pode aparecer como decimal. Uma odd decimal de 2,75 indica que o retorno será 2,75 vezes o valor apostado. Ou seja: uma aposta de 4 reais que é vencedora com essa odd dá um retorno de 11 reais (4 vezes 2,75 é igual a 11). Repare que uma odd decimal de 2,75 é a mesma coisa que uma odd fracionária de 7/4.

A odd ajuda também a entender matematicamente o quão provável um evento é de acontecer na visão da casa de apostas — algo conhecido como probabilidade implícita.

A probabilidade implícita é o inverso da odd decimal. Para achar o inverso, divide-se 1 pela odd decimal.

No exemplo acima, uma aposta que pague odds de 2,75 tem 36% de chances de ser vencedora (1 dividido por 2,75 é igual a 0,36, ou seja, 36%). Pode-se concluir também que essa aposta tem 64% de chances de ser perdedora.

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Quem ganha: apostador ou casa de apostas?

Ganhar eventualmente uma aposta ou outra é perfeitamente possível e provável.

A aposta esportiva é muito diferente de uma loteria, em que as probabilidades de ganho são remotas. As chances de se ganhar na Mega-Sena, por exemplo, são de 0,00000002%.

O desafio maior nas apostas esportivas é ganhar consistentemente no longo prazo.

E não basta apenas ganhar mais vezes do que perder. É possível ter alto índice de acertos, e ainda assim perder dinheiro.

É o caso de quem sempre aposta nos favoritos. O retorno financeiro para cada aposta vitoriosa é muito pequeno, já que as odds dos favoritos são sempre baixas. E pior que isso: apenas uma aposta perdedora é suficiente para aniquilar todos os ganhos com várias vencedoras.

Digamos que uma pessoa aposte 100 reais sempre em um favorito que pague uma odd de 1,1. Se em dez apostas, ela acertar nove — um índice alto de acertos, de 90% — ela ganhará 90 reais. Mas ainda assim seu resultado final será um prejuízo de 10 reais — já que terá perdido 100 reais na única aposta perdedora.

Igualmente apostar nos azarões não é sustentável. O apostador pode ganhar uma grande soma de dinheiro apostando em alguém que tinha poucas chances e pagava odds enormes — mas seus ganhos serão anulados com a provável derrota de todos os outros azarões nos quais também apostou.

Para ganhar consistentemente, é preciso haver um equilíbrio — calculando-se exatamente quanto deve ser alocado em cada aposta de acordo com as probabilidades relacionadas ao jogo.

Mas conseguir isso é muito difícil, como mostram os exemplos abaixo.

Primeiro inimigo dos apostadores: margem das casas de aposta

As odds das apostas são decididas pelas casas de apostas.

E este é um dos primeiros obstáculos para os apostadores — porque as casas sempre embutem nas odds as suas margens de ganho (também chamadas de “vigorish”).

Uma forma simples de calcular a margem é somando a probabilidade implícita (o inverso) de todas as odds que a casa paga para uma determinada aposta.

Matematicamente, essa soma deveria dar 100%. Afinal, um jogo só pode terminar com vitória, derrota ou empate.

Mas em casas de apostas, essa soma sempre é maior que 100%. E o excedente é justamente a margem da casa de apostas.

Vamos pegar um exemplo: um jogo entre Vasco e Palmeiras. As odds de uma casa de apostas para esse jogo podem ser:

  • 4,410 para vitória do Vasco
  • 3,740 para empate
  • 1,787 para vitória do Palmeiras.

As probabilidades implícitas (inverso das odds) para esse jogo são: 22,68% de vitória do Vasco, 26,74% de empate e 55,96% de vitória do Palmeiras. A soma dessas probabilidades é 105,38%.

A margem da casa é, portanto, de 5,38% — o excedente. Esse é um dos grandes inimigos dos apostadores.

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Imagine um apostador que fosse distribuir seu dinheiro proporcionalmente em todos os resultados no exemplo acima:

  • 22,68 reais em vitória do Vasco
  • 26,74 reais em empate
  • 55,96 reais em vitória do Palmeiras.

O valor total de sua aposta é 105,38 reais.

Como ele apostou proporcionalmente em todos os resultados possíveis, é de se esperar que ele receba exatamente o total que apostou — qualquer que seja o resultado do jogo.

Mas seu retorno real seria:

  • Em caso de vitória do Vasco: 100,01 reais (22,68 reais vezes odds de 4,410)
  • Em caso de empate: 100,01 reais (26,74 reais vezes odds de 3,740)
  • Em caso de vitória do Vasco: 100,00 reais (55,96 reais vezes odds de 1,787)

Em todos os cenários, o retorno seria negativo — com perda de 5,38 ou 5,37 reais.

Ou seja: as casas de apostas não estão pagando exatamente o proporcional às probabilidades de um evento acontecer. Elas estão pagando um pouco menos.

Segundo inimigo dos apostadores: lei dos grandes números

No longo prazo, esse “pouco menos” significa prejuízos enormes para os apostadores e ganhos grandes para as casas de apostas.

É o que os matemáticos chamam de a Lei dos Grandes Números — que diz que quanto mais uma experiência for repetida, mais ela vai se aproximar do seu valor esperado (as probabilidades esperadas).

Essa lei matemática é a base do modelo de negócios bilionários da indústria de cassinos.

Em 10 ou em 100 tentativas, um apostador pode até sair no lucro — mesmo que as odds não lhe sejam favoráveis. Mas depois de um determinado patamar, digamos 1,000 ou 10,000 apostas, invariavelmente o resultado observado começa a caminhar em direção às odds do jogo.

No caso dos cassinos, um jogo de blackjack (ou vinte-e-um) tem as seguintes odds, em média: 42% de chances de vitória do apostador, 9% de chances de empate e 49% de chances de derrota.

É perfeitamente possível jogar algumas partidas de blackjack e sair com um bom lucro da mesa. Essa ilusão de vitória é justamente o que atrai os apostadores, já que 42% de chances de ganhar pode não parecer pouca coisa.

Mas ao longo de múltiplas apostas e muito tempo (às vezes meses ou anos), o apostador certamente sairá perdendo. Por trás de cada pessoa que sai com uma pequena fortuna de um cassino, há mais pessoas que saem com os bolsos vazios.

O mesmo acontece com as apostas esportivas, já que — como vimos acima — as odds jogam sempre contra o apostador. Afinal, a odd de uma casa de aposta é sempre um pouco inferior à probabilidade de o evento acontecer.

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Como ganhar das casas de apostas

Para ganhar dinheiro no longo prazo, é preciso derrotar as casas de apostas com consistência.

E a forma de derrotá-las é possuindo odds melhores do que elas. Ou seja: saber quando a casa de apostas está estimando errado as probabilidades de um jogo — e portanto está pagando demais por um dos resultados.

Vamos a outro exemplo. Digamos que um jogo entre São Paulo e Corinthians, as odds de uma casa de aposta sejam:

  • 2,3 para vitória do São Paulo
  • 2,95 para empate
  • 2,62 para vitória do Corinthians.

As probabilidades implícitas estimadas pela casa são: 43,48% de vitória do São Paulo, 33,90% de empate e 38,17% de vitória do Corinthians.

Se o apostador tiver estimativas mais precisas do que essas que mostrem, por exemplo, que as chances de vitória do São Paulo são maiores do que 43,48% (digamos 45% ou 50%), ele pode apostar mais dinheiro nesse resultado.

Mas não basta fazer isso em apenas um jogo. É preciso conseguir estimativas mais precisas do que a casa de apostas consistentemente ao longo de diversas apostas — satisfazendo a Lei dos Grandes Números.

Chegar a essas estimativas mais precisas é justamente o maior desafio — e é onde as casas de aposta levam enorme vantagem em relação aos apostadores.

Como as casas de apostas fazem para ganhar

Um argumento comum de pessoas que assistem a muitos jogos de futebol é que elas entendem mais do esporte do que a maioria das pessoas — portanto estão mais propensas a ganhar.

Mas o conhecimento sobre futebol é quase irrelevante no mundo das apostas, dizem os especialistas.

“O conhecimento do jogo já está embutido nas probabilidades. Por exemplo, um jogo pode receber 10 mil apostas. Isso significa que são 10 mil pessoas que sabem algo sobre futebol e o conhecimento delas está embutido nas odds. Não é que você está jogando contra uma outra pessoa. Você está jogando contra 10.000 pessoas que acham que entendem de futebol. Às vezes, essas 10.000 pessoas cometem grandes erros, mas normalmente isso não acontece”, diz David Sumpter.

O pulo do gato para se ganhar dinheiro com apostas não é saber de futebol — é conhecer matemática.

“Você tem que começar com as probabilidades. É isso que as pessoas esquecem. Elas pensam ‘eu preciso entender muito sobre futebol’. Mas ela precisa começar sabendo muito sobre probabilidades. E a maioria não entende muito sobre probabilidades de futebol, como as odds são definidas e como tentar vencê-las.”

A mina de ouro das apostas são os modelos matemáticos.

Modelos são equações matemáticas que usam dados da realidade para fazer previsões. Eles partem de dados estatísticos do passado (as entradas ou inputs do modelo) — como gols marcados e sofridos, por exemplo — para fazer previsões futuras sobre qual time tem mais chances de vencer.

E é nesse ponto que entra a alta tecnologia para estabelecer as odds.

As casas de apostas que existem no mercado usam odds que são geradas por companhias e profissionais altamente especializados. Essas companhias contratam matemáticos e usam alguns dos modelos mais avançados no mercado.

As odds desses matemáticos especializados são difíceis de serem batidas. E em cima dessas odds, as casas de apostas ainda colocam a sua margem, dificultando ainda mais a tarefa.

“A tecnologia vem melhorando muito a cada ano. A cada dia, há novos modelos sendo usados, novos algoritmos, novas tecnologias. Há 20 anos atrás, provavelmente era muito mais fácil ganhar das casas de aposta do que é hoje”, diz Joseph Buchdahl.

Buchdahl dá o exemplo de um modelo matemático que foi usado durante décadas por apostadores, garantindo muitos lucros no passado: o modelo Dixon-Coles. Esse modelo levava em consideração, entre outros fatores, os gols marcados e sofridos por equipes nos últimos jogos para tentar prever o resultado de uma partida.

“A tecnologia mudou. Se você fosse tentar usar o modelo Dixon-Coles hoje em dia, você não teria chance alguma contra as casas de aposta.”

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Nos últimos anos, o modelo da moda é o de gols esperados (cuja sigla é xG). Esse modelo é muito mais sofisticado: ele calcula a probabilidade de chutes virarem gols. Ele é muito mais intenso no uso de dados, pois requer estatísticas mais completas sobre o que aconteceu exatamente nas partidas recentes das equipes.

Uma pessoa que faz uma aposta pode pensar que está apenas competindo contra outros apostadores ou com a casa de apostas. Mas na verdade ela está enfrentando uma briga muito maior.

Buchdahl afirma que a maioria dos apostadores profissionais sequer usa casa de apostas comuns — que são encaradas por eles como parte da indústria do entretenimento.

Os profissionais preferem usar as chamadas “betting exchanges”, que são uma espécie de bolsa, onde apostadores podem criar suas próprias odds e apostar uns contra os outros. É nesses espaços — usados por apostadores com grande grau de sofisticação — que os melhores modelos matemáticos costumam ser empregados.

E o setor está ficando cada vez mais competitivo.

Com a explosão da inteligência artificial e do aprendizado de máquina, Buchdahl diz que a modelagem matemática para apostas está praticamente virando “uma corrida armamentista” — tamanho é o nível de sofisticação dos novos modelos.

“Há muito mais dados no futebol hoje em dia. Há estatísticas de jogadores, estatísticas de posse, estatísticas de passes. É ridículo quanto dado temos hoje. Se você tem acesso a esses dados, você pode começar a jogá-los no seu modelo e ver se ele melhora. Por um tempo, você pode até conseguir ter um modelo melhor e ganhar algum dinheiro. Mas logo vem alguém e consegue superar você”, diz Buchdahl.

“É como um esporte profissional, por um tempo Djokovic, Federer e Nadal eram os melhores [no tênis masculino]. Agora eles estão sendo substituídos.”

A estratégia perfeita. Mas ela funciona?

Há diversas modalidades de apostas disponíveis: apostar em cartões amarelos e gols específicos ao longo da partida, por exemplo. Também é possível usar “handicaps”, que são ajustes nas odds para torná-las mais favoráveis ao apostador.

Além disso, há diferentes estratégias. Muitos apostadores costumam “cobrir” suas apostas, que é fazer uma nova aposta para mitigar o risco de uma aposta original.

Mas os matemáticos alertam que mesmo essas modalidades e estratégias não são suficientes para ganhar das casas de apostas no longo prazo — mesmo que algumas delas sirvam para melhorar as chances do apostador.

Mas existe uma uma estratégia que, surpreendentemente, é sempre bem-sucedida em qualquer cenário — pelo menos matematicamente falando. Trata-se da arbitragem (também chamada de “aposta certa” ou “surebet”).

Na teoria, ela é perfeita, mas na prática, ela não costuma funcionar no longo prazo — e isso apenas reforça como as casas de apostas são praticamente imbatíveis para a maioria das pessoas.

A estratégia da arbitragem envolve buscar odds diferentes para um mesmo evento em casas de apostas diferentes. Se as probabilidades (inversos das odds) dessas casas de apostas somadas forem inferiores a 100%, existe oportunidade para arbitragem. Ou seja: o apostador vai ganhar em qualquer cenário.

Vamos a um exemplo. Digamos que em uma partida entre Flamengo e Grêmio, seja possível encontrar as seguintes odds em casas de apostas diferentes:

  • Casa de apostas 1: vitória do Flamengo, odd de 2,5
  • Casa de apostas 2: empate, odd de 3,6
  • Casa de apostas 3: vitória do Grêmio, odd de 3,4.

É fundamental buscar odds em casas de apostas diferentes. Quando as odds são tiradas de apenas uma casa de apostas, a soma das probabilidades é sempre superior a 100% — como vimos no exemplo de Vasco e Palmeiras. E o excedente é a margem de lucro da casa.

Mas nesse exemplo, com odds de casas diferentes, ela é inferior. A soma das probabilidades nesse caso é 97,19% — 40% de chances de vitória do Flamengo, 27,78% de chances de empate e 29,41% de chances de vitória do Grêmio.

Para garantir um retorno em qualquer cenário, é preciso espalhar as apostas proporcionalmente. A fórmula para essa distribuição é: dividir a probabilidade de o evento acontecer pela soma das probabilidades totais, e multiplicar tudo pelo valor apostado.

No caso de 100 reais, eles seriam distribuídos da seguinte forma:

  • Apostar no Flamengo: 40% / 97,19% x 100 reais = 41,16 reais
  • Apostar em empate: 27,78% / 97,19% x 100 reais = 28,58 reais
  • Apostar no Grêmio: 29,41% / 97,19% x 100 reais = 30,26 reais

Os retornos para cada cenário seriam:

  • Vitória do Flamengo: 41,16 reais x odd de 2,5 = 102,90 reais
  • Empate: 28,58 reais x odd de 3,6 = 102,89 reais
  • Vitória do Grêmio: 30,26 reais x odd de 3,4 = 102,88 reais

Como foram gastos 100 reais nessa aposta, existe um retorno garantido de cerca de 2,89%.

Essa é uma margem bastante alta para uma aposta sem riscos.

Se parece um cenário bom demais para ser verdade, é porque é exatamente isso.

Na prática, há dois obstáculos grandes para arbitragem. O primeiro é que encontrar odds que possibilitem a arbitragem nem sempre é fácil. As próprias casas de apostas ajustam suas odds em tempo real de acordo com mudanças promovidas por suas rivais — justamente para dificultar que essas oportunidades surjam.

“A menos que você tenha um bot (robô) que esteja fazendo as apostas simultaneamente, sempre há o perigo de que uma odd possa mudar antes que você consiga garantir as odds finais”, diz Buchdahl.

O segundo obstáculo são as próprias casas de aposta, que monitoram esse tipo de atividade.

“As casas de apostas não toleram vencedores. E elas certamente não toleram apostas de arbitragem porque elas argumentam que é ruim para seus negócios. E assim que eles suspeitarem que você está fazendo isso, eles fecharão sua conta”, diz Buchdahl.

A arbitragem não é uma atividade ilegal, mas as casas de apostas se reservam o direito de não atenderem clientes e suspenderem apostas — o que está explícito nos termos e condições.

Mas é justo que casas de apostas possam barrar clientes?

“A casa de apostas não é obrigada a fazer negócios com você. Se eles consideram que você não é lucrativo para o negócio deles, eles não vão o aceitar como cliente. É assim que o capitalismo funciona”, afirma Buchdahl.

David Sumpter diz que no Reino Unido há até mesmo sites especializados em detectar e realizar apostas de arbitragem. Mas as margens são pequenas e muitas contas acabam bloqueadas depois de poucas rodadas, assim que as casas de apostas identificam essa atividade.

Buchdahl não acredita que arbitragem seja uma estratégia sustentável no longo prazo justamente por causa desse jogo de gato e rato com as casas de apostas. Para ser bem-sucedido, diz ele, seria necessário ter contas em cerca de dez casas de apostas diferentes — e seria necessário abrir novas contas com nomes diferentes a cada suspensão.

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Quem já conseguiu ganhar das casas de apostas

Os especialistas apontam as dificuldades de se conseguir ganhar das casas de apostas. Mas eles acreditam que ainda assim é possível. Inclusive isso já foi feito.

Um caso notório é o do britânico Matthew Benham, formado em Física pela universidade de Oxford no final dos anos 1980. Depois de uma passagem pelo mercado financeiro, Benham resolveu desenvolver modelos matemáticos para fazer apostas esportivas.

Ele aperfeiçoou o modelo Dixon-Coles (citado acima nesta reportagem) e fundou a SmartOdds, uma empresa pioneira de pesquisa estatística voltada para apostadores profissionais. Ele também virou investidor na Matchbook, um site de apostas pioneiro no formato de “betting exchange”.

O sucesso de seus modelos foi tão grande que Benham virou milionário — ao ponto de comprar o seu clube de futebol do coração, o Brentford. Desde que Benham assumiu o controle do clube, o Brentford voltou à primeira divisão do bilionário futebol inglês.

Para matemáticos, a história de Benham ilustra que os maiores lucros no mundo das apostas esportivas não estão com os apostadores — mas sim nas casas de apostas e nos matemáticos que conseguem gerar um conhecimento que é valioso.

Sumpter e Buchdahl seguiram esse exemplo. Eles próprios já contemplaram no passado a ideia de se tornarem apostadores profissionais, mas logo perceberam que havia outros caminhos mais lucrativos.

Ambos escreveram livros e artigos sobre apostas esportivas e usam seu conhecimento — e não apostas — para ganhar dinheiro.

Sumpter fundou uma empresa, a Twelve Football, que fornece consultoria matemática a diversos clubes de futebol no mundo, inclusive na Premier League inglesa.

Buchdahl criou um site em que fornece dados que informam modelos estatísticos usados por apostadores. Ele ganha dinheiro com anúncios em seu site. Além disso, muitos dos artigos que ele escreve são publicados em uma seção educativa do site da Pinnacle, uma casa de apostas famosa por suas odds sofisticadas.

“É possível ganhar dinheiro criando modelos matemáticos e eu conheço pessoas que fizeram isso e ganharam dinheiro assim”, diz Sumpter.

“Mas logo eles acabam indo trabalhar para casas de apostas ou até mesmo viram donos de casas de apostas. Você pode ganhar muito mais dinheiro e ter uma fonte de renda regular dessa forma.”

A vida de um apostador profissional, segundo ele, envolve não só altos riscos, mas também custos enormes. É preciso investir pesadamente em educação e, hoje em dia, em poder computacional. Além disso, é preciso ter muito capital para realizar as apostas. Considerando-se um retorno médio de 3% — uma meta difícil até para profissionais — é preciso ter 1 milhão de reais para obter um retorno de 30 mil.

Essas dificuldades fazem com que a maioria das pessoas que querem se tornar apostadores profissionais acabem desistindo depois de um tempo. Buchdahl calcula que a maioria das pessoas percebe isso depois de cerca de mil apostas.

Fonte: BBC News Brasil