A difícil missão de ser e ter voz feminina na política de Mato Grosso

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Por: Gisela Simona Viana de Souza

É de domínio público a informação que o Estado de Mato Grosso se destaca no cenário nacional e mundial por ser rico na sua produção agrícola, atividade econômica que ainda prepondera a liderança de homens no comando e quando falamos de liderança aqui se inclui poder econômico, poder político, poder de mando, ou seja, culturalmente temos um Estado em que as forças do poder e do dinheiro concentra-se majoritariamente nas mãos dos homens. Algum problema com essa constatação? Não, se o reflexo disso não fosse obstáculo para que homens e mulheres em igualdade de condições pudessem ser escutados nas mais diversas áreas da nossa sociedade.

Em 2018 tive a oportunidade de entrar na vida política, numa disputa eleitoral, fato inédito na minha vida pessoal, cujo resultado surpreendeu os mais dedicados analistas políticos da nossa região. Afinal, quem era essa mulher, negra, servidora pública, sem parentesco conhecido, que merecia o acolhimento de 50.682 mato-grossenses? A imprensa falava em “fenômeno de votos”.

Tudo tinha sido muito espontâneo. Uma eleição sem planejamento adequado, sem apoio de um nome público, sem investimento financeiro, mas feita com muita verdade, muita esperança na mudança, crença na representação de consumidores cansados de pagar a fatura cara da exploração econômica, de mulheres pretas humilhadas no seu dia a dia e de servidores públicos que não conseguem ver sua representação no parlamento seja estadual ou federal. Foi essa realidade de muitos de nós que meu nome surge na política mato-grossense e fica cravado na história como a mulher negra com maior número de votos para deputada federal na capital Cuiabá – foram 12% dos votos válidos.

Esse capital político despertou nas mulheres outras esperanças: se ela pode, eu também posso! Foi esse um dos resultados mais gratificantes que ouvi das mulheres. Ouvi pai de meninas, maridos e filhos comentando o empoderamento das mulheres com o resultado e foram tantos que quando o tabuleiro das eleições de 2020 iria fechar com vários homens candidatos a prefeito de Cuiabá, pensamos –não pode faltar uma mulher.

Uma campanha curta, no meio de uma pandemia, exigia uma mulher com capital político, conhecimento sobre Cuiabá e capacidade de mostrar soluções para as necessidades de um povo carente de serviços públicos essenciais da nossa cidade.  Foi assim que aceitei ser candidata a Prefeita de Cuiabá, mesmo sabendo que em 301 anos de história, nossa cidade nunca elegeu uma mulher prefeita.

Fui analisada dos pés a cabeça, com toda desconfiança do planeta sobre minha capacidade de estar onde estava, foram centenas de entrevistas, debates, pesquisas, curiosidades predominando sempre a pergunta: Por que você quer ser prefeita de Cuiabá? Perguntas pesadas que indiretamente diziam por que você não está cuidando de sua casa e de sua família ao invés de estar aqui nessa disputa?

A cada olhar desconfiado e pergunta “atrevida” eu deveria saber responder com o equilíbrio e conhecimento necessário para mostrar que estava preparada. Que não era uma aventura; que eu saberia o que fazer e como fazer, mais do que isso que meu passado e minha história de serviços prestados é uma referência confiável. Foi nesse contexto que surgiu no debate das eleições o tema: políticas públicas para mulheres.

Tenho muita honra de ter inserido com destaque no plano de governo um capítulo inteiro voltado para as mulheres e mais do que isso, feito sair do papel e trazer para as rodas de conversa e debates as propostas dos demais candidatos sobre o que fazer para esse público que corresponde há mais de 50% da população e ainda tem menor espaço no mercado de trabalho, sofre sem reparos a violência doméstica e não encontra no poder público ferramentas adequadas para se reerguer da dor, da discriminação, da falta de emprego e das desigualdades estruturais impostas por nossa sociedade.

Nesse dia 08 de março é importante falar dessa experiência para que todos saibam das dificuldades, mas também para saber que não é impossível, que quando nós mulheres falamos que podemos estar onde quisermos estar: Podemos sim, estar na política de Mato Grosso, ser e ter a voz de muitas mulheres que não tiveram a mesma oportunidade.

Essa conquista só depende da determinação e coragem que temos para enfrentar todos os obstáculos do dia a dia que nos cercam.

Gisela Simona – advogada, 1ª suplente de Deputada Federal e 3º lugar nas eleições para Prefeita de Cuiabá-MT em 2020