Desde que a cobrança pelo estacionamento rotativo nas ruas centrais de Cuiabá começou a vigorar, na última terça-feira (20), a vendedora de roupas fitness femininas de uma loja na tradicional rua Pedro Celestino, Simone Jordão, viu o movimento despencar. As vagas para carros em frente ao estabelecimento passam a maior parte do dia vazias e ela teme pela invasão de moradores de rua e pedintes no local. Atualmente, eles se concentram e se acumulam na região mais abaixo do Centro, próximo ao Morro da Luz.
“Está sendo horrível. O pessoal fala que se for para pagar [o estacionamento] e não ter nada, eles preferem ir para o shopping. Depois que começou [a cobrança], parou o movimento. E se o movimento para, quem vai fazer movimento aqui é os nóias”, lamenta.
A loja onde ela trabalha é um dos pontos de venda e de informações selecionados pelo Consórcio C.S Mobi, responsável pela gestão do estacionamento rotativo implantado na região central. Contudo, a vendedora sequer passou por treinamento para tirar dúvidas dos consumidores. “Eu não sei como funciona e não sei explicar, eu só entrego o panfleto e falo para pessoa ler”, testemunhou ao RepórterMT.
Ela se refere ao informativo sobre o aplicativo “Digipare”, que deve ser baixado para o motorista realizar o pagamento. O documento apresenta ainda outra opção, que são os já citados pontos de vendas, responsáveis por emitir o ticket eletrônico e realizar as recargas de crédito dentro do app. Há ainda os parquímetros, em que o usuário faz o pagamento diretamente na máquina assim que estaciona o carro em uma vaga concessionada. Em todos os casos, é necessário informar a placa do carro.
O esvaziamento das ruas, com a consequente queda de vendas e crescimento do número de moradores de ruas circulando pela região, também vem preocupando Alexandra Aparecida da Silva, gerente de uma ótica na mesma Pedro Celestino. Segundo ela, o movimento caiu entre até 80% e a típica abordagem dos vendedores aos pedestres ficou mais difícil, porque não tem gente nas ruas. Ela critica ainda a dificuldade imposta com o aplicativo para pagamento e a falta de fiscais do Consórcio C.S Mobi para orientar os motoristas.
“Caiu [o movimento] porque os clientes ficam com receio para estacionar, sem uma orientação. Nem todo mundo sabe mexer com o aplicativo e está bem orientado para usar. Aqui na Pedro Celestino não fica ninguém, o rapaz que fica passando não fica aqui. Quem está orientando? Então, a pessoa coloca o carro aí [ela aponta para a vaga em frente a loja] e ela vai baixar o aplicativo, cadastrar, pagar. É muito complicado e já toma um tempo do cliente. O cliente não vai querer estacionar aí, ele quer praticidade e vai buscar o shopping”, reclama.
Em outro ponto de venda, na rua Cândido Mariano, o vendedor de uma ótica, João Antônio Celloni, também reclama da falta de garantia de segurança. Conta ainda que na última quinta-feira, durante todo o dia, vendeu somente seis bilhetes eletrônicos do sistema rotativo. “Os carros foram para o estacionamento privado”, avalia.
O cenário inicial contraria as expectativas da Câmara de Dirigentes Logistas (CDL) de Cuiabá, que vê com bons olhos a iniciativa da privatização das ruas.
O ‘Cidade Verde Estacionamento Rotativo Digital’ demarcou 2.300 vagas e está cobrando R$ 3,40 a hora/carros e R$ 2 a hora/motos, sendo o tempo máximo de permanência nas vagas o de 4 horas. Mas a motorista Angelice, flagrada pela reportagem estacionando, disse que sequer sabia como deveria proceder para pagar o valor cobrado. Ela acredita que a cobrança é justa, desde que o dinheiro arrecadado seja utilizado para melhorar a infraestrutura da região e tapar os buracos das ruas estreitas do Centro. Além disso, Angelice reivindica segurança para os veículos.
“Se está cobrando pelo estacionamento e você larga o seu carro na rua com cobrança, então se acontecer alguma intercorrência de quebrarem um vidro e roubarem alguma coisa, eles têm que se responsabilizar por isso também, já que o Código de Defesa do Consumidor fala isso”, argumenta.
Por conta dessa questão da segurança, o Procon-MT notificou o Consórcio C.S Mobi para que promova alterações imediatas para continuar cobrando dos motoristas que utilizarem as vagas disponibilizadas. Entre as mudanças está a exigência de que a concessionária passe a se responsabilizar por quaisquer danos causados aos veículos, sob pena de ser multada em até R$ 9 milhões.
Renan Marcel / Repórter MT
Parquímetros são só encontrados nas áreas mais nobres.
Parquímetros só na área nobre
Por outro lado, na região mais nobre do centro, como no bairro Goiabeiras, os motoristas abordados não encontraram dificuldades para estacionar e pagar os valores cobrados. Por lá, os parquímetros estão espalhados em várias esquinas – no Centro Histórico ainda não foi autorizada a instalação dos aparelhos, por questões relativas ao tombamento histórico e à infraestrutura das calçadas estreitas – e os fiscais da concessionária abordam os motoristas assim que eles estacionam os carros para instruí-los.
Quando a reportagem chegou à praça 8 de Abril, a empresária Everluce Arruda, moradora de Várzea Grande, estava sendo auxiliada por um dos fiscais. Tinha acabado de baixar o aplicativo. Ela afirma que só viu benefícios com o sistema, uma vez que, para ela, ficou mais barato do que utilizar estacionamentos privados e surgiram mais vagas.
“Foi rápido e fácil. Não senti dificuldade não. Ele [o fiscal] me disse que tenho a opção de comprar antes de estacionar. Eu acho que é um sistema vantajoso e beneficia os clientes. Acredito que falta informação para a população entender. Ainda bem que tem eles aqui orientando. Agora eu sei que posso comprar 4 horas e utilizar vagas em vários pontos do Centro”, explica. (Repórter MT)