Incêndios no Pantanal alteram ecossistema e favorecem invasão de espécies resistentes ao fogo

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Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) indicam um aumento de 1.240% nos focos de queimadas no Pantanal entre 1º de janeiro e 14 de outubro de 2024, em comparação com o mesmo período do ano passado. A recorrência de incêndios no bioma, observada nos últimos anos, ameaça a biodiversidade da maior planície alagada do mundo e pode até favorecer a invasão de espécies resistentes ao fogo.

Isso porque incêndios frequentes e intensos, quando acontecem repetidamente na mesma área, acabam mudando, ao longo do tempo, as plantas e os animais que vivem no bioma. É o que explica a bióloga Luciana Leite, defensora da biodiversidade e do clima na organização internacional voltada ao meio ambiente, Environmental Justice Foundation (EJF).

De acordo com Leite, o verde que emerge assim que as chuvas voltam não representa a recuperação do bioma. “Comumente, vemos as pessoas conectarem a mudança de cor da paisagem – de cinza para verde – com uma possível resiliência do Pantanal. Mas, o que temos é a emergência de espécies vegetais primárias, mais resistentes ao fogo e muitas vezes também espécies invasoras”, disse em entrevista ao PNB Online.

O fogo pode destruir plantas mais sensíveis, como gramíneas, arbustos e árvores. Em algumas regiões, estudos indicam que a recuperação pode levar décadas, mas isso só será viável se os incêndios intensos e recorrentes cessarem, algo que não tem ocorrido no bioma. Depois das queimadas que devastaram o Pantanal em 2020, houve uma queda no número de hectares queimados nos três anos seguintes, mas a devastação voltou a crescer neste ano em várias unidades de conservação.

Uma das que mais tem sofrido em Mato Grosso é o Parque Estadual Encontro das Águas. Conhecida como o ‘Coração do Pantanal’, a unidade abriga uma das maiores populações de onças-pintadas do mundo. Por lá, 30,19% do parque já foi queimado apenas este ano, de acordo com dados do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Lasa/UFRJ).

Conforme Luciana, a região abriga populações saudáveis de espécies únicas e ameaçadas de extinção, que deveriam encontrar ali um ambiente seguro e equilibrado para prosperarem. “A destruição do Parque seria uma perda não só ambiental, mas para toda a humanidade – incluindo gerações futuras. É um dos últimos grandes refúgios de vida silvestre do Pantanal que, na contramão das tendências globais, segue tendo menos de 5% do seu território protegido”, afirma.

Na última semana, mais de 120 agentes, incluindo militares do Corpo de Bombeiros de Mato Grosso, brigadistas e servidores estaduais, combateram um incêndio de difícil acesso na Fazenda GCSJ, dentro do parque, em Poconé. De acordo com o Governo Estadual, o combate contou com o apoio de nove aeronaves, caminhões-pipa e máquinas terrestres.

Ambientalistas de diversos locais do Brasil e do mundo têm alertado para a necessidade de atuação mais eficaz e preventiva. Luciana defende que governos, sociedade e comunidade internacional ainda não fazem o suficiente diante da gravidade da destruição ambiental em curso no Brasil. Para ela, é necessário pensar em soluções inovadoras, em altos investimentos, em cooperação técnica e entre setores e nações.

“O que vivemos hoje no Pantanal e em outros biomas brasileiros é resultado de uma combinação devastadora de mudanças de uso do solo e mudanças climáticas – é a consequência de décadas de desmatamento, conversão de florestas em pastagens, emissão de gases do efeito estufa, construção de hidrelétricas, etc”, afirma.

Eurodeputada exibe cinzas do Pantanal no parlamento europeu

Cinzas de incêndios no Pantanal neste ano foram exibidas no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, na França, na última quinta-feira (10.10), durante sessão plenária que discutiu os impactos devastadores dos incêndios da Amazônia no clima. “A cinza que tenho aqui vem do Pantanal […] A Europa também tem isso em sua consciência. O que a Comissão [Europeia] vai fazer para proteger não apenas a Amazônia, mas também o Pantanal e o Cerrado?”, disse durante a sessão a eurodeputada Anja Hazekamp, que exibiu as cinzas durante a sua fala.

Fonte: PNB