As esperadas chuvas de março não chegaram, e o pantanal deve passar pela pior seca da história, alertam ambientalistas. Com níveis dos rios baixos em período que deveria estar em plena cheia, a planície ainda tem pela frente a escassez hídrica regular de maio a setembro, o que agrava o risco de incêndios.
O pantanal recebe a água das chuvas das regiões de planalto da bacia do Alto Paraguai.
No calendário natural, o ciclo começa em outubro, com picos em dezembro e janeiro, se estendendo até março, no máximo.
Nas enchentes, as águas transbordam das calhas dos rios, conectam lagoas e formam amplas e contínuas áreas alagadas.
“O pantanal está vivendo seca extrema em uma época que deveria estar cheio”, alerta Eduardo Reis Rosa, pesquisador e membro da plataforma científica MapBiomas.
A situação pode ser verificada pela régua de Ladário, instalada na parte alta da bacia do rio Paraguai, monitorada pelo 6º Distrito Naval da Marinha.
Em março deste ano, o nível do rio Paraguai, principal responsável pela inundação do bioma, começou o mês com 0,87 centímetros e, até agora, não passou dos 0,92 centímetros.
Em 2023, o rio chegou a 1,93 centímetros, fechando o mês com 2,45 centímetros.
Uma mudança na situação, segundo Reis, pode ser esperada com o fim do El Niño, previsto para os próximos meses, e com a chegada do fenômeno meteorológico La Niña, que tem chances de ocorrer no segundo semestre.
O La Niña costuma trazer chuva para boa parte do Brasil e contribui para a queda das temperaturas. Por isso, pode ser um alívio para o pantanal, mas a atuação no bioma é incerta.
Em 2020, foi sob a influência desse fenômeno climático que o pantanal passou por um dos piores incêndios da história, com 3,9 milhões de hectares atingidos pelo fogo.
O cenário pessimista também é traçado pelo biólogo Gustavo Figuerôa, da ONG SOS Pantanal. “Já está pior que 2021, acredito que será a pior seca da história do bioma.”
Além dos números, o ambientalista se baseia no que está vendo nos afluentes que integram a bacia do rio Paraguai, onde se assenta a planície do pantanal.
No último dia 20, Figuerôa publicou nas redes sociais a secura do rio Miranda, localizado no distrito de Águas do Miranda, em Bonito (MS), que fica a cerca de 150 km do Pantanal.
Nas imagens, é possível observar que onde deveria estar inundado é possível passar a pé, pisando nos cascalhos depositados no fundo do rio.
“Tem parte que está com 70 centímetros no leito principal, isso aqui também é a realidade do pantanal.”
O biólogo cobra uma ação prévia mais contundente das autoridades, com plano de manejo integrado do fogo, que serve para prevenir incêndios, em parcerias entre os governos federal, de Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, os dois estados brasileiros onde o pantanal se localiza.
Cyntia Santos, analista ambiental da ONG WWF, diz que o bioma precisa estar em alerta até o fim do ano, em razão da ameaça dos incêndios florestais.
Dados do Cemtec (Centro de Monitoramento do Tempo e do Clima) do governo de Mato Grosso do Sul indicam tendência de chuva atualmente entre 600 e 800 milímetros, enquanto o normal seria de 1.400 milímetros.
Além disso, as altas temperaturas aceleram o processo de evaporação, o que agrava a seca.
“É a soma perfeita: área seca, altas temperaturas, falta de recurso hídrico, pessoas e animais esgotados”, resume Santos.
A analista ambiental acredita que a criação das brigadas pantaneiras e a compra de equipamentos, aviões e outros insumos foram medidas positivas para o combate aos incêndios nas últimas temporadas.
Atualmente, há 59 brigadas, formadas por ribeirinhos, pantaneiros e indígenas, treinados com apoio das ONGs que atuam na proteção ao bioma.
Em Mato Grosso do Sul, o governo estadual diz ter elementos suficientes para subsidiar a publicação de decreto de situação de emergência para auxiliar nas ações de conscientização, prevenção e combate a incêndios no estado, principalmente, no pantanal.
Os dados foram apresentados em reunião no dia 20. O relatório da Cemtec mostra ainda que, de 1º a 25 de março, dos 44 municípios analisados, 35 registraram chuva 50% abaixo do volume esperado para o mês caso das cidades pantaneiras de Corumbá, Aquidauana, Miranda, Anastácio e Ladário.
Também foi apresentado o plano de trabalho do Corpo de Bombeiros para a temporada de incêndios florestais de 2024.
Além das ações estaduais, o governo federal também precisa apresentar o plano de prevenção e combate ao fogo, em prazo de 90 dias, conforme determinação do STF (Supremo Tribunal Federal).
Fonte: Diário de Cuiabá